sábado, março 31, 2007

A Narrativa Mística do Tempo

O conto que preencheu as duas últimas aulas é da autoria do escritor argentino Jorge Luis Borges e surge em 1941, inserido no movimento da literatura modernista...
A obra centra-se na personagem Yu Tsun, um professor de inglês, e situa-se aquando da I Guerra Mundial. O protagonista virá a encontrar o Dr. Stephen Albert, que ficara encarregue de decifrar um enigma deixado por Ts’ui Pen, antepassado de Tsun e monge e sábio chinês, que um dia escrevera um livro intitulado de “o Jardim dos Caminhos que se Bifurcam”, à semelhança do próprio conto em análise.
Por detrás desta narrativa, emerge uma temática avassaladora mas mística, a do tempo, visto como um jogo de caminhos que se atraem e repelem mutuamente.
A existência é, pois, um labirinto, um trama ilimitado de possibilidades, de séries, de movimentos cíclicos, que capturam os seres na sua rede alucinante.
No nosso corpo e na própria natureza está reflectido este ciclo do universo temporal, através das manifestações e reacções físicas, como a fome, o sono, o envelhecimento, a morte... são os traços visíveis da evolução do tempo, uma entidade eminente e irremediável.
Este conto não remete apenas para o dramático destino de qualquer ser vivo ou morto que exista no cosmos, condenado ao desaparecimento, mas remete para temporalidades alternativas, para várias dimensões - o que contradiz a nossa vivência e o nosso conhecimento empírico da realidade -, alude para outras considerações senão as da matemática e da física (propostas por Newton e Schopenhauer, por exemplo), capazes de apresentar teorias fabulosas de complexas formas de vida, paralelas, simultâneas, onde tudo é possível, como baralhar ordens lógicas de passado, presente e futuro. Para o autor, sublinhando as ideias d Ts’ui Pen, o tempo não é absoluto, definitivo, e o labirinto pode ser algo capaz de conceber múltiplas significações na escrita e na realidade universal das coisas.

sexta-feira, março 30, 2007

Labirinto

Segundo a lenda grega, o Labirinto foi concebido pelo artista ateniense Dédalo, em Cnossos, na ilha de Creta, a mando do rei Minos, para ser a morada do Minotauro (um monstro metade homem e metade touro). O Minotauro foi morto por Teseu, o príncipe de Atenas, que conseguiu encontrar o caminho para sair do labirinto guiando-se por um fio que lhe fora oferecido por Ariadne, uma das filhas do rei Minos. Este mito levanta o problema da escolha, ao mesmo tempo que fornece o instrumento para o resolucionar.

Um labirinto é constituído por um conjunto de percursos complicados, difíceis de resolver. Criados com a intenção de desorientar quem os percorre. Podem ser construções tridimensionais (como o já referido labirinto de Creta, ou um conjunto de sebes plantadas de forma a proporcionar entretenimento num jardim), desenhos (como os labirintos que aparecem nos jornais como passatempo), etc...Utiliza-se frequentemente o termo para adjectivar outros géneros de obras. Por exemplo, diz-se de um romance com enredo complicado ou cuja narração não é linear que é "labiríntico".Este jogo de bifurcações interroga e traz à luz o prazer narrativo fundado na combinação do revelado e do oculto, do oferecido e do recusado...

O termo “labirinto” chega também à Internet. Uma leitura labiríntica num sítio Web tem a particularidade de ser multisequencial, de conceder ao internauta a escolha dos inúmeros percursos possíveis. Saltando, por tentativas e alguns erros, de site em site, de tema em tema.
Esta estratégia pode conduzir a resultados de busca interessantes e diversos.

O Tempo

É um meio indefinido onde se desenrolam, irreversivelmente, as existências na sua mutação, os acontecimentos e os fenómenos na sua sucessão. Pode-se dizer que um acontecimento ocorre depois de outro acontecimento. Além disso, é possível medir o quanto um acontecimento ocorre depois de outro. A separação dos dois acontecimentos é um intervalo, a quantidade desse intervalo é a duração.
Uma forma de definir o depois baseia-se no facto de os efeitos se ligarem às causas.

A concepção comum de tempo é indicada por intervalos ou períodos de duração. É este intervalo que define a base de medida do tempo.
Por influência de ideias desenvolvidas por Einstein(teoria da relatividade), tempo tem sido considerado como uma quarta dimensão do contínuo espaço-tempo do Universo, que possui três dimensões espaciais e uma temporal. Dimensão que permite que dois acontecimentos idênticos que ocorrem no mesmo ponto do espaço se possam distinguir por terem ocorrido em tempos diferentes.

Retemos a percepção de um instante, experimentamos uma sucessão de instantes e constatamos uma persistência. A realidade comporta transformação e conservação.

Os conceitos de tempo e de memória são inseparáveis, sem memória não haveria tempo. O passado pressupõe uma memória já preenchida, o futuro é uma memória por preencher ainda; e o presente tem uma significação cujo valor é apenas subjectivo, encontrando-se somente na nossa consciência.

À luz dos ensinamentos da Relatividade, em situações que nos são desconhecidas sobre a nossa Terra, mas que existem no Universo, podemos conceber estimulantes viagens no tempo e, se não realizá-las, imaginá-las, sem que estejamos a praticar ficção científica.

Labirintos


Labirintos...

Um labirinto é habitualmente conhecido como sendo um conjunto de caminhos interceptados entre si, e onde, após a sua entrada é muito difícil encontrar a saída.
Várias são as concepções que ao longo do tempo têm sido atribuídas aos labirintos, quer a nível mitológico, quer literário ou religioso. Mas serão apenas estas as concepções possíveis de um labirinto? Ou não será a própria vida humana também um labirinto?
No texto “O jardim do caminhos que se bifurcam”, Jorge Luís Borges acentua a importância do tempo na nossa vida, e descreve o percurso da principal personagem como sendo um labirinto, onde através da escolha de diversos caminhos pretende alcançar um objectivo.
Não será então a vida de cada um de nós um labirinto também? Onde o nascimento representa a entrada e a morte a saída?
Também nós, ao longo das nossas vidas somos confrontados com caminhos distintos que nos guiam a diversos destinos, e tal como num labirinto, cabe-nos a nós escolher aquele que achamos ser mais adequado.
Mas independentemente do percurso que tomemos, uma coisa é certa, todos entramos nele e todos vamos acabar por, de um modo ou de outro, sair dele.

quinta-feira, março 29, 2007

Livro ao longo dos tempos

A história do livro está directamente ligada à história da humanidade e sua evolução nos diversos meios sócio-culturais e geográficos. Hoje, chamamos de livro a uma reunião de folhas que contem informações impressas e presas por um lado e montadas com uma capa. Mas na antiguidade não era bem assim.Entre os sumérios o livro era um tijolo de barro cozido, argila ou pedra, com textos gravados ou cunhados. Esse tipo de escrita foi designado também de cuneiforme e foi o primeiro registro humano de escrita, datado de três mil anos a.C.
Com o surgimento do pergaminho, feito geralmente da pele de carneiro, tornou-se possível a confecção de livros como os que nós conhecemos, diferenciando dos actuais no tamanho. Mais tarde, com a chegada do papel à Europa e com o invento da prensa de Gutenberg, o livro impresso, feito de papéis costurados e posteriormente encapados, tornou-se realidade. Com essa invenção foi possível fazer vários exemplares do mesmo livro, a um preço acessível, popularizando e democratizando, deste modo, a leitura.
Contudo a evolução continua e o século XXI surgem dezenas de novos modelos de suporte para leitura, mais propriamente, o livro electrónico que apresenta inúmeras vantagens. Assim, ao contrário do livro, não está limitado por qualquer tipo de fronteiras. Põe ao dispor do leitor uma infindável variedade de textos que não se dispõem de acordo com uma ordem sequencial de princípio, meio e fim, mas que se apresenta ao leitor como se estivesse eternamente a meio do processo de leitura, cujo fim é impossível alcançar.
Em suma, seja em que forma for, o livro não deixa de ser um meio de comunicação importante no processo de transformação do indivíduo, pois ao ler um livro, evoluímos e desenvolvemos a nossa capacidade crítica e criativa.

quarta-feira, março 28, 2007

SOS de Augusto de Campos

Esse poema retrata a existência humana. Ou seja o individuo inserido na colectividade. "que faremos sem pai, ...sem mãe...?"Aqui mostra que o individuo não existe por si só, mas sim no colectivo, no meio partilhado por vários individuos para que o individuo permaneça.
SOS indica o percurso do homem num mundo que terá um fim embora não sabemos quando e como vai ser esse fim.
Esse poema é um grupo de signos semelhantes, com movimentações semelhante a rotação do universo e vice versa. Por isso a sua leitura considera se dificil. os signos designam o eu(ego, inch, I, io...) e o colectivo.
O SOS que aparece no centro, no fim, vem como um pedido de esclarecimento sobre a origem do homem e alerta para o fim do universo." o silêncio, a noite,...sem sol.." tem esse sentido do fim.

terça-feira, março 27, 2007

(In)tangibilidades

As tecnologias digitais perpassam, actualmente, pela maioria das nossas experiências vivenciais. A percepção que detínhamos em relação a determinados elementos mudou radicalmente, com a advinda das novas tecnologias.
No caso da literatura, foi e continua a ser notável, o impacto das tecnologias digitais. Com a digitalização, o livro, enquanto objecto, sofreu muitas transformaçãos, quer exteriormente, quer interiormente. Embora, discutíveis, são indubitáveis os benefícios do livro digital. Para além de proporcionar ao leitor a possibilidade de analisar e "adquirir" qualquer obra literária, sem qualquer encargo financeiro a "scannização" permite também a preservação literária de obras clássicas ( já muitas obras se perderam). A bíblia de Guttenberg digitalizada é um excelente exemplo do "contacto" que o leitor poderá ter.
A digitalização dos livros também garante a sua fidegnidade (um bom exemplo da possível deturpação a que os livros estavam sujeitos na era medieval/copista é a leitura de o "Nome da Rosa" de Umberto Eco).
A poesia concreta beneficiou largamente com as novas tecnologias. A aliança entre estas e a poesia proporcionou ao leitor/ouvinte uma experiência sensorial mais vasta.
Todavia, a digitalização também alterou a percepção e o sentido dos leitores em relação aos livros. O tacto de um livro digital é incomparavelmente diferente do tacto de um livro físico. Tactear a capa, a contracapa, contemplar as ilustrações é para mim um prazer que nunca poderá ser suplantado pelo livro digital. O odor (quem não adora o cheiro de um livro novo?) é um outro elemento que poderá ser considerado insignificante para muitos, mas é identificativo de um livro.
Daí que o ter não implica necessariamente o ser...

ainda na mesma linha

Ainda dentro da temática da evolução do livro, analisámos na última aula uma distinta propriedade do meio digital, não comparável a qualquer outra do manuscrito ou do códice, pois sai da esfera literária para entrar na do progresso técnico. Falámos do processo de remediação, ou seja, de transposição de características específicas de um meio para outro, normalíssimo, pode mesmo neste caso utilizar-se a palavra, nos períodos de evolução/transformação dos mesmos, onde algumas se adaptam, outras se conservam, e outras ainda se transformam. Neste caso particular, o que a Universidade do Texas conseguiu a mais que Gutemberg, foi divulgar a mesma obra sem ter de a copiar. Pura e simplesmente digitalizando-a. Penso que um bom exemplo da remediação, pois mantém-se a obra na íntegra, diferenciando apenas a sua materialidade. Relativamente à materialidade dos textos, tal como foi também discutido, é neste ponto que mais visivelmente se distingue um livro "tradicional", com páginas, capa, peso, toque, um livro palpável, de um livro electrónico, cuja parte física reside somente no próprio computador. De certa forma, pode considerar-se portanto que o livro digital não existe fisicamente, apenas a sua expressão no ecrã. Daí a sua precariedade, pois se algum dia a informática colapsar será como um gigatesco incêndio numa Biblioteca de Babel.

Enigma n, Jim Andrews

O sentido não é estático. O significado das coisas está em constante formação e transformação. Este trabalho de Jim Andrews assemelha se ao raciocínio que seguimos para adquirir e dar significado as coisas. Ou seja o movimento das letras de acordo com as opções que tomamos assemelha ao percurso que tomamos para formar sentido. Com os "clicks" nas opções, as letras mudam de tamanho,cor, disposição na pagina e o movimento acelera ou diminui. Assim pode se dizer que o sentido difere de momento para momento e de época a época. De acordo com as opções o "Meaning" aparece, desaparece e reaparece numa outra forma.
Temos um sentido claro sobre uma determinada palavra e durante algum tempo, com certas movimentações e mudanças de algo a nossa volta, o sentido pode tornar se confuso mas depois volta a reaparecer de uma forma diferente.

sábado, março 24, 2007

O livro electrónico e o livro impresso

O livro electrónico é um dos arautos da era da informação. Aparece como um meio que promove a avaliabilidade e facilita a transmissão dos conteúdos informativos. Michael Hart em 1971 conseguiu acesso a um supercomputador que constituía um dos doze nodos da rede que iria dar origem à internet, e funda o Projecto Gutemberg. Este projecto empenha-se na transposição de obras clássicas para o formato digital. O Projecto Gutemberg disponibiliza actualmente cerca de 20 000 títulos, essencialmente clássicos da nossa cultura não protegidos por direitos de autor, gratuitamente, assumindo assim uma função de serviço público global de promoção da cultura.
Todavia, a provável substituição do livro de formato impresso pelo de formato digital não é um processo que possa vir a ter uma linha clara separando uma era de outra. A questão do suporte é, em qualquer manifestação da arte e da cultura, condicionante das práticas de produção e recepção destas, acontecendo um enraizamento sociológico destes meios que os tornam símbolos de épocas, ou mesmo eras, e objectos de culto. Exemplos disso são os defensores do disco de vinil na música, actualmente em ressurgimento, dos gravadores DAT analógicos, e todos os bibliófilos e bibliocleptómanos.
No caso referido da bibliotece on-line Gutemberg, o que se passa é uma simples transposição do conteúdo do objecto livro para um formato digital. Todavia as implicações desta mudança de suporte indicam poderem levar a uma transformação do próprio conceito de «livro». A mudança do material afecta a forma do conteúdo, e para além desta simples transposição da obra numa versão digital, este novo meio tem especificidades que servem ao nascimento de novas formas de apresentação do discurso, nomeadamente a exploração das potencialidades do hipertexto, a introdução de imagens e movimento e ficheiros de som. Por enquanto uma página do "hi5" não pode ser considerada um livro, mas não se sabe qual a evolução da coisa... O livro electrónico ao importar o conceito «livro» transporta-o para fora do seu ambiente natural. Há a diferença do "interface", desde a necessidade de um computador ou outro suporte para alojar o "e-book" até à utilidade da paginação, menos eficaz electronicamente mas compensada pela possibilidade de efectuar buscas rápidas. As regras de propriedade intelectual e direitos de autor, ligadas ao sistema económico da produção dos livros, sofrem actualmente uma forte revolução, não tendo ainda estabilizado.
Alguns dos pontos fortes do "e-book" são tornarem a informação mais acessível ao público, facilitar-lhe o acesso, e permitir a posse de um número grande de obras sem ocupar muito espaço. A Wikipedia (http://en.wikipedia.org/wiki/E-book) indica-nos mais algumas: a sua reprodução tem um baixo custo, a cópia é instantânea, não são passíveis de esgotar em stock, são ecológicos e não se deterioram com o tempo. Em contrapartida o livro comum é um objecto que se reveste de uma carga afectiva para o seu possuidor, sendo objecto de culto e de colecção. As bibliotecas, pessoais ou públicas, têm uma aura especial e inclusive uma mística (ver Jorge Luis Borges, «A biblioteca da Babel», in Ficções), constituindo por excelência o espaço do saber. O espaço ocupado pelo livro torna-o um objecto de que se pode cuidar, ou seja, estabelecer uma relação pessoal. O livro tem um carisma físico que se perde com a digitalização. Nem as recentes invenções de empresas de Silicon Valley, de sistemas portáteis (o "Softbook") de leitura de livros digitais com modem integrado, reproduzindo o tacto e permitindo anotações com canetas apropriadas, substituem adequadamente, para já, o livro impresso. Outras das suas desvantagens são o custo destes instrumentos e os problemas de defesa da privacidade que levantam (o fenómeno do "phoning home", ou o envio não autorizado de informação de qualquer computador ligado à internet para o seu I.P.), e, claro, o desconforto do ecrã.
A proliferação de meios diversos de suporte de informação é no entanto algo que em si constitui uma vantagem, permitindo uma utilização adequada às necessidades ou desejos de cada um. O intelectual poderá tornar-se mais facilmente um nómada, e se a sua única paixão forem os livros, o seu lar cabe na palma da mão. Mas todas estas transformações estão um pouco aquém do poder de intervenção de um indivíduo, correspondem a um processo inevitávél de transformação das práticas culturais e das formas da comunicação.

A Evolução da "Espécie" Livro

A evolução do livro acompanha a evolução do próprio Homem, enquanto ser intelectual, curioso e entendedor dos vários campos que explora e desvenda.
A necessidade de preservar os seus conhecimentos em suportes materiais escritos e o surgimento das primeiras formas de "livro" remontam à Antiguidade.
Na verdade, aos vários períodos históricos em que ocorre o aperfeiçoamento da escrita (Antiguidade, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea), correspondem várias formas de a representar, respectivamente, como em tabuletas de pedra, o papiro, o pergaminho, o códice, - a partir do qual se passa a vislumbrar o livro como objecto -; o papel e a acção dos monges copistas, a invenção da imprensa e dos caracteres móveis, por parte de Gutenberg, no século XIV. – protagonista da obra “A Bíblia de Gutenberg”, analisada nas aulas precedentes, que teve um papel ímpar na revolução da escrita.
A partir deste momento, a produção e a recepção do livro consolidou-se a massificou-se, caracterizando os séculos seguintes, nomeadamente o XIX, no qual ‘brotam’ os populares livros de bolso e os vários géneros literários, acessíveis a qualquer público.
A Era Moderna abre caminho para os séculos XX e XXI, ora, a Época Contemporânea. Actualmente, são múltiplas as técnicas, as elaborações estéticas e os conteúdos dos livros. A particularidade desta nova Idade não é só a abundância e diversidade trazida pela indústria dos mass media; mas surgem novos suportes e formas de representar uma obra, não se restringindo apenas ao livro impresso, encadernado, composto por folhas de papel. Agora, o mundo conhece o livro electrónico, que tem por base um suporte informático relativamente recente, o computador, e todas as possibilidades digitais que dele advêm. A concepção de “obra” modificou-se, propagou-se para diferentes materialidades, tendo mais- valias, mas também decepcionando muitos dos fervorosos defensores do “livro – objecto”.
Independentemente das suas diferentes configurações e formas, continua a ser um dos mais preciosos legados antepassados e dos mais promissores meios de divulgação informativa, intelectual e cultural de sempre.

sexta-feira, março 23, 2007

A Violência Imposta Na Multiplicidade de Sentidos Oferecidos

Ao longo da leitura dos diversos textos abordados em aula, com especial incidência nos últimos textos lidos, temos constatado- e isso é já ponto de acordo geral- que a mutação da forma de um texto em relação aos conceitos pré-convencionados proporciona- em grande escala- modos de leitura mais abertos e até, por vezes, modos de leitura em tudo diferentes daqueles que seriam, à partida, ditos "normais".
Aqui, neste espaço que não existe fisicamente mas que está ao serviço e em representação do espaço-sala e por isso o é também [como se, agora, enquanto escrevo, falasse perante a turma e perante o professor, e os meus signos escritos (ortográficos) fossem as articulatórias ondas sonoras do timbre da minha voz (signos sonros)], muito se tem comentado a "fisionomia" textual da poesia concreta (e hipermédia) e muito se tem tentado esboçar possíveis interpretações sugeridas como conteúdo por essas mesmas formas. Porém, aqui, ainda não se escreveu fria e cruamente acerca da importância para a poesia (concreta ou não) da multiplicidade de interpretações surgeridas. Factor importante de explorar por si, independente de exemplos textuais.
Num poema concreto existirá com certeza um sentido mais completo e próximo do sentido que lhe foi impresso pelo poeta (repare-se no paradoxo da palavra "impresso") aquando da criação. Todavia, já na fase de produção, podemos imaginar que o hipotético poeta terá, propositadamente, dotado as suas palavras de alguma ambiguidade e polissemia, permitindo que o conjunto final de signos por ele produzidos possam vir a despoletar por si mesmos uma pluralidade de interpretações, inúmeros caminhos por percorrer.
Quanto mais aberto for o texto final, e isso sabemo-lo na literatura e na arte poética no global, maior número de sentidos poderá abranger, logo, "tocará" mais pessoas, fazendo com que um maior número delas se reveja no conteúdo do escrito/ descrito.
Na poesia concreta, por este ser um ponto sempre tido em conta, tal facto é flagrante e prementemente necessário, uma vez que é da violência de sentidos (isto é, da infinidade construtiva destes, da infinita possibilidade de, através de diferentes conjecturas e interpretações, chegar a diferentes leituras) que ela a si própria se cria e a cada momento rejuvenesce.

S.O.S. de Augusto de Campos

Um poema bastante particular, de leitura não muito fácil e de significado discutível.
É acompanhado de som (como se fossem ondas de rádio a tentar transmitir para mais além...), as cores (preto e amarelo) suscitam uma dimensão cósmica, uma referência ao corpo celeste.
Iniciado com um fundo negro (talvez relacionado com o céu nocturno) que se vai, gradualmente, enchendo de significância. Letras soltas vão aparecendo, e a pouco e pouco vamos percebendo a materialidede dos signos. O “eu” em várias línguas (universalidade da mensagem) mostra a consciência individual, que num outro momento passa a colectiva (“que faremos nós sem sol, sem mãe, sem pai...sos”). Uma introspecção que recai sobre a dependência que temos do meio em que vivemos e das pessoas com quem nos relacionamos.
Como que uma projecção futura - a espécie humana condenada ao desaparecimento.

O poema”SOS” da autoria de Augusto Campos lembra de imediato ao leitor um cenário cósmico. Na verdade, o texto começa com aparecimento gradual de 7 ou 8 pronomes em várias línguas (eu/ ich/я…), cuja movimentação lembra o movimento das próprias planetas, sendo o som que acompanha o poema, também um elemento importante na construção deste ambiente espacial.
Com efeito, o poema tem como tema a interrogação humana sobre o seu próprio destino o que se torna bem visível quando o poema passa do nível individual para o nível colectivo, imitando deste modo, a reflexão do homem sobre a sua existência. Assim, o poema acaba com uma explosão e consequente desaparecimento de letras que sugere um fim, ou seja, o fim do mundo.

SOS e a espiral do silêncio

Após várias visualizações do poema “SOS”, o resultado é sempre o mesmo: um calafrio percorre o corpo e um arrepio acerca-nos a alma.
“SOS” reproduz um ambiente que inquieta o leitor: as letras flutuam num fundo preto, como se fossem estrelas; ouvem-se sons que fazem lembrar-nos do espaço, da escuridão...
Essas letras, gradualmente, tornam-se palavras, frases, perguntas que levam o leitor a incomodar-se a pouco e pouco...
Na minha opinião, esse mal-estar é produzido pelo medo à solidão e ao silêncio de um indivíduo qualquer, numa sociedade qualquer. Por além disso, a disposição do texto em forma circular, leva-me a lembrar da teoria da espiral do silêncio. Foi a socióloga Élisabeth Noelle-Neumann quem, nos anos 1970, desenvolveu esta teoria. A teoria da espiral do silêncio defendia "o princípio de que o que caracteriza o indivíduo em toda a sociedade humana é o medo do isolamento". Segundo a teoria da socióloga alemã, as pessoas que dentro de uma sociedade mantêm ideias diferentes ás da maioria, optam por ficar calados por medo a serem isolados do resto. Assim, o poema de Augusto de Campos tenta transmitir essa ideia: apresenta-nos o indivíduo, a seguir o próprio indivíduo dentro da sociedade e por último, uma série de perguntas que são respodindas com silêncio...

quinta-feira, março 22, 2007

Bíblia de Gutenberg - um dos primeiros livros impressos.

Livro...a palavra deriva do termo latino liber ("livre"), que designava as matérias "libertadas" de uma planta, utilizadas para fazer os primeiros livros, nomeadamente folhas e cascas de árvores, e, posteriormente, linho, seda, barro, cabedal e papiro. O papiro foi sendo progressivamente substituído pelo pergaminho, uma membrana seca obtida graças à secagem de pele de vaca, de borrego ou de cabrito...

No Ocidente, em 1455, Johannes Gutenberg inventa a imprensa com tipos móveis reutilizáveis. Como os livros da época eram escritos à mão, por monges, alunos e escribas, cada livro demorava meses a ser preparado e, portanto o seu preço era elevadíssimo e inacessível para a maioria das pessoas. Mas com a impressora de tipos móveis, o livro popularizou-se definitivamente, tornando-se mais acessível pela enorme redução dos custos da produção em série. O primeiro livro impresso nessa técnica foi a Bíblia em latim. Houve certa resistência por parte dos copistas, pois a impressora punha em causa a sua ocupação.
A partir desse momento, um livro passou a ter a designação de volume transportável. Um suporte de informação organizada (texto e/ou imagens), dotado de sentido portátil. Um conjunto de folhas reunidas (que podem ser coladas ou cosidas) e envolvido por uma capa, uma contracapa e uma lombada.
Na sua estrutura interna pode encontrar-se um índice. Este permite-nos “fugir” a uma leitura linear, uma vez que estando organizado, o leitor pode apenas ler o que realmente lhe interessa e passar de um capítulo para outro sem que se perca o sentido da informação.
O livro é, também, um produto intelectual e, como tal, encerra conhecimento, expressões individuais ou colectivas.

quarta-feira, março 21, 2007

Augusto de Campos - SOS

A proximidade entre a palavra SOS e sós surge como um alerta, um aviso para a possibilidade e o perigo de ficarmos sozinhos.
Na primeira circunferência surge a palavra "eu" em várias línguas, podendo isto significar que todos estamos sujeitos à solidão,independentemente do nosso lugar no mundo ou da situação em que nos encontramos.Mas esta ideia de solidão pode ainda ser mais abrangente se pensarmos no Homem como um ser sozinho na imensidão do Universo.Existe uma acentuada referência ao cosmo que está presente em vários elementos do poema: as cores amarelo e preto;a disposição das letras fazendo lembrar a órbita dos planetas ou mesmo o sol;o som e a voz que facilmente associamos a um ambiente cosmológico.Pode, então, estar também aqui presente uma referência a pequenez e à susceptibilidade do Homem, tão indefeso perante a imensidão do Universo.

Enigma = Meaning

Encontramo-nos perante o “Enigma N”, ou seja, um enigma qualquer. É aquilo que se nos apresenta como o desconhecido. Porém, nós tentaremos encontrar a solução do enigma. Tentaremos torná-lo conhecido ao nosso olhar. Isto é, encontrar o seu significado.
A pergunta é: como podemos agir para encontrar o significado?
Só precisamos de olhar para as palavras "Enigma" e "Meaning". Assim, damos conta de que da reordenação da primeira, chegamos a "Meaning", que quer dizer "significado" em português. O próprio enigma facilita-nos uma série de elementos com os quais poderemos encontrar o significado correcto. Entretanto, devemos realizar várias operações que nos aproximarão da solução. Baralhamos os diferentes elementos, a devagar, mais rápido. Paramos por um segundo porque pensamos que conseguimos resolver o enigma. Achamos que não pode ser algo tão fácil e tentamos outras operações mais difíceis. Agora mudamos as cores, os tamanhos, a velocidade do movimento dos elementos... Até que finalmente, estamos a olhar para algo que é familiar, que podemos reconhecer: o significado.

terça-feira, março 20, 2007

Enigma n...


Quando lemos procuramos o significado, a mensagem do texto, o seu sentido.
Porém, os signos não têm sempre a mesma interpretação e deciframos o código quando conseguimos estabelecer comunicação.
Em Enigma n é necessário ter em conta o contexto da aplicação das letras que recombinam com as letras de meaning·. O baralho de letras, a mudança e aplicação de cores, a congelação das mesmas e a recombinação de todos estes elementos desperta nos leitores uma multiplicidade de leituras e de vários sentidos recombinados.
Tal como todos os textos Enigma apresenta elementos de comunicação. O emissor que é o autor, ele emite e codifica a mensagem, o receptor que é o leitor, este recebe e descodifica a mensagem, essa mensagem contem o conteúdo transmitido pelo emissor, porém pode conter um nível descodificação elevado. O canal que é o meio pelo qual circula a mensagem e a sua apresentação tanto pode ser em linguagem verbal ou não verbal.
E sendo assim, mesmo que alguns textos quebrem a habitual convenção que nos permite ler da esquerda para a direita unindo silabas, separando as palavras, criando frases e que não apresentem ordem/forma de leitura, obrigando o leitor a acertar nas sequências e nos percursos, podem ter sentido, podem ter significado e podem ter mensagem. Simplesmente, os elementos de comunicação não se apresentam na forma habitual da maioria dos textos que lemos.






· Significado- tradução para português.

Evolução

Do pergaminho ao livro manuscrito, do códice impresso ao hipertexto, são quatro as etapas base de evolução do livro. Em todas identificamos um mesmo objectivo, de perservar e partilhar informação, derivando desta, outras preocupações, consoante os momentos históricos. Actualmente, na era digital e com o hipertexto, a conservação de conteúdos parece ter-se tornado na menor delas, sobrevalorizando-se quantidade em detrimento da qualidade. Se temos acesso quase imediato a um volume de informação há meia dúzia de décadas atrás inimaginável, não há nada que nos garanta a credibilidade da mesma, pelo que esta brutal liberdade de publicação não nos é obrigatoriamente uma mais-valia, podendo mesmo constituir um problema, e levar-nos a afirmar barbaridades que tomámos como verdadeiras. Não que seja fã de censuras prévias ou póstumas, e é fantástico podermo-nos expressar ao planeta inteiro sem sairmos do nosso quarto. No campo das opiniões é muito bom, no dos factos um pouco menos, se bem que também nunca teremos certezas absolutas acerca de ditos factos enciclopédicos ocorridos nos anos 1000 (pois efectivamente, nenhum de nós, por enquanto, os pode ir lá confirmar). Pondo as coisas nestes termos, o que a hipermedia nos dá, que, comparativamente, a literatura nos tira, é tempo. O que é óptimo, pois em vez de semanas a fio de procura de obras e autores relaccionados para explorar um determinado tema, podemos sentar-nos calmamente em frente do nosso computador, escolher mesmo um de muitissimos motores de pesquisa, teclar "teorias sociológicas neo-evolucionistas de white", "política socio-económica do Qatar", "desporto no Antigo Egipto", "rituais de wicca" ou outra coisa qualquer, ao jeito de anúncio publicitário, sem perguntas e deixando mais tempo para o que é importante. A partir daí, os links fazem o resto. Descobrimos não só o que queríamos, como o que não queríamos, e ainda o que não sabíamos que queríamos e que também muito pouco tem a ver, mas que podemos investigar numa nova janela, ou na noite seguinte.
No que toca à literatura digital, um tapete vermelho de oportunidades desenrola-se aos nossos olhos, em que podemos sempre ser a estrela. Qualquer pessoa pode ser autor, comunicar, criticar, apresentar-se ao mundo, sem que nada nem nenhum velho do restelo conservador e capitalista a impeça. Para além das possibilidades técnicas e gráficas que o digital permite, de forma a organizar, complementar, acrescentar e dinamizar as obras, com uma enorme liberdade de expressão. Com som, movimento, cor e imagem, se as perspectivas interpretativas são muito maiores, compreendemos também melhor a do autor.
Parte agora de cada um de nós pensar bem no que escreve pois vai ser visto por um planeta inteiro. Se bem que se pode sempre lá ir corrigir...

sábado, março 17, 2007

À frente, ou dentro do ecrã?


“PoemaBomba”, tal como se nos apresenta, capta a nossa atenção e obriga os nossos sentidos a fixá-lo por momentos. Aos poucos, somos cada uma das letras à espera do momento da explosão, todos nós somos vermelho e “dinamite”... cada vez mais tensos, maiores... cada vez mais atraídos pelo som e movimento, somos poema e somos bomba. Afinal, estaremos à frente do ecrã, ou dentro do ecrã?
Para quê a hipertextualidade? Para quê a substituição da simples palavra impressa por um conjunto de diferentes materialidades digitais? Porque não conservar a expressão “Poema Bomba” num pedaço de papel, apenas? Porque já não basta. Porque as velhas práticas de leitura e de escrita entram em decadência e sofrem sérias alterações com o decorrer do tempo. Gutenberg não faria melhor. É a única forma de as manter activas para as próximas gerações. É que a forma e originalidade que o autor dá à sua obra modificam também os seus receptores.
O insaciável Homem exige de si próprio a criação de novos sentidos para o mundo, que acompanhem as próprias evoluções materiais e tecnológicas.
É assim que o recurso a outras materialidades permite transformar facilmente um poema num ‘corpo’ visivelmente em cólera, em dor, prestes a detonar. Ou um corpo em poema.

sexta-feira, março 16, 2007

Texto vs Individuo

A interpretação de um texto é como uma reacção expontânea ou reflectida a um estímulo externo. Funciona como o reflexo de várias personalidades num só individuo, porque supostamente os leitores têm diferentes niveis de conhecimento.
Começa-se por interpretar os significados de um código linguístico, criando-se uma imagem cerebral do contexto e depois amplia-se ou distancia-se o ângulo de visão sobre esse contexto.
Qualquer pessoa adequa o seu comportamento em função do interlocutor, do contexto, do código e do tipo de discurso. O texto funciona de forma semelhante, porque depende de quem o escreve ou interpreta, das condições de emissão-recepção e das condições psicológicas e cognitivas do seu receptor.
Se faz sentido ou não, depende da abertura psicológica que o receptor/leitor dedica à interpretação das mensagens, quer sejam visuais, sonoras, estáticas ou interactivas.

As primeiras 7 aulas (sumários)

Augusto de Campos, coraçãocabeça (1980).

Lição 1, 21-02-2007
1. Apresentação do programa da disciplina
1.1. Bibliografia, webografia e métodos de avaliação
1.2. Inscrição no blogue da disciplina: «DIGLITMEDIA», http://diglitmedia.blogspot.com/
2. Introdução à materialidade e à literacia digitais
2.1. Projecção dos poemas animados de Ana Maria Uribe «El circo: anipoema por entregas» (2001-2002) e «Deseo Desejo Desire: 3 anipoemas eróticos» (2002)

Lição 2, 23-02-2007
1. Leitura integral em voz alta do conto «Amor» (1960), de Clarice Lispector
2. Análise dos diversos momentos e formulação de hipóteses de interpretação:
2.1. Qual o lugar da voz do/a leitor/a na interpretação?
2.2. Qual é o acontecimento central do conto?
2.3. Como se manifesta a mudança na percepção do real?
2.4. Que relação há entre o título e a estória?
3. Início da audição da obra de Rui Torres Amor de Clarice, com a faixa 1 do CD-áudio: «deformada pelas compras, suspira»

Lição 3, 02-03-2007
1. Audição da obra de Rui Torres Amor de Clarice (2005), com a faixa 2 do CD-áudio: «uma perigosa hora na tarde»
1.1. Qual a relação entre o tema musical e o conto de Clarice Lispector?
1.2. A noção de remediação: descrição da materialidade específica de cada um dos meios.
2. Projecção e análise do poema hipermédia Amor de Clarice, de Rui Torres. Descrição de algumas das suas propriedades:
a) multisequencialidade de percursos de leitura como propriedade estrutural da obra
b) manifestações de interactividade entre leitor e obra (possibilidade de recombinação das sequências animadas e, dentro de cada sequência, da ordem relativa dos fragmentos de texto)
c) estrutura hipertextual
d) multimedialidade e intermedialidade: combinação de escrita, voz, música, imagem estática e imagem animada (de fonte digital ou obtida fotograficamente)
e) iconicidade: semelhança entre propriedades dos signos e propriedades dos objectos que os signos representam
f) disposição constelada ou espacializada dos significantes
3. Audição de «Pome poem» (1972) de bpNichol

Lição 4, 07-03-2007
1. Audição de «Pome poem» (1972) de bpNichol
2. O que é um poema?
2.1. O lugar das expectativas e convenções na definição de poema
2.2. A materialidade dos textos enquanto materialidade sonora e visual
2.3. O poema como performance corporal
3. A poesia concreta como precursora da poesia digital
3.1. O texto constelado
3.2. A linguagem como objecto
3.3. A decomposição fónica, gráfica e semântica da língua e da escrita
4. Projecção dos poemas de Augusto de Campos «eis os amantes» (1953), «tensão» (1956) e «coraçãocabeça» (1980)

Leituras recomendadas:
Aguilar, Gonzalo (2005): “Poesia depois do Verso”, in Poesia Concreta Brasileira: As Vanguardas na Encruzilhada Modernista, São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, pp. 175-205.
Santaella, Lúcia (2006): “A Poesia Concreta como Precursora da Ciberpoesia”, in Suplemento Literário de Minas Gerais, Outubro de 2006, pp. 31-35.


Lição 5, 09-03-2007
1. Audição de «tensão» (1956), de Augusto de Campos, e de «Loch Ness Monster’s Song» (1970), de Edwin Morgan. Descrição de algumas das suas propriedades:
a) a graficalidade e visualidade dos textos
b) a tensão entre som e sentido: o som como matéria e como forma; o sentido como matéria e como forma
c) a voz como matéria do texto
d) a escrita como notação e a leitura como performance e interpretação: aspectos semióticos e hermenêuticos
e) a leitura como construção da matéria do texto e a leitura como construção do sentido do texto
2. Projecção do poema cinético «Enigma n» (1998), de Jim Andrews


Lição 6, 14-03-2007
1. Projecção e análise de «Enigma n» (1998), de Jim Andrews
2. O que é o sentido? O que torna possível a significação?
2.1. A função dos códigos nos processos de produção de sentido.
2.2. A significação como processo situado e contextual: a dimensão cultural e individual do sentido
2.3. Estabilidade e instabilidade semântica da linguagem
2.4. O sentido como associação entre significante e significado: do vocabulário comum às terminologias
2.5. O sentido como movimento na cadeia dos significantes: a criatividade e a ambiguidade como propriedades fundamentais da linguagem.
3. Projecção e análise dos poemas cinéticos «poemabomba» (1983-1997) e «SOS» (2000), de Augusto de Campos.

Leituras recomendadas:
Portela, Manuel (2006): «Concrete and Digital Poetics», in Leonardo Electronic Almanac, Special Issue: New Media and Poetics, Vol 14, No. 5-6, Cambridge, Massachussets: M.I.T., Sept 2006.

Lição 7, 16-03-2007
1. Códices e computadores
1.1. Análise da simulação digital da Bíblia de Gutenberg (Ransom Center, Universidade do Texas, Austin) e do sítio web do poeta-cantor Arnaldo Antunes
2. Características do livro: escrita e leitura no espaço impresso
2.1. O código bibliográfico: o livro como estrutura
2.2. Formas de indexação e de meta-informação no espaço do livro
3. Características do hipertexto electrónico: escrita e leitura no espaço digital
3.1. O sítio web como modelo de organização do ciberespaço: relações hierárquicas e associativas entre ficheiros ou dentro de ficheiros
3.2. O ciberespaço como estrutura arborescente, reticular e labiríntica

Leituras recomendadas:
Eco, Umberto (2003): «Vegetal and Mineral Memory: The future of books», in Al-Ahram Weekly, Issue No. 665, 20-26 November 2003.
Furtado, José Afonso (2002): «Livro e Leitura no Novo Ambiente Digital», in Enciclopédia e Hipertexto.
Furtado, José Afonso (2003): «O Papel e o Pixel», in Ciberscópio.

quinta-feira, março 15, 2007

Augusto de Campos Sos & poema-boma

Nos primeiros segundos do sos e do poema-bomba deparamo-nos instantaneamente com uma das principais características da poesia de Augusto de Campos: há uma vontade do autor em quebrar a tradicional forma de interpretação do leitor, obrigando-o a recorrer não apenas ao sentido visual, mas também ao sentido auditivo.
Existem algumas similitudes entre o sos e o enigma n de Jim Andrews. Tal como no enigma n, as cores usadas são sombrias, enigmáticas, e uma vez mais, a cor negra é a que mais prevalece.
As letras que brotam sugerem a presença de estrelas, e o movimento das palavras que posteriormente surgem assemelham-se a um sistema planetário (é uma outra semelhança com o poema de Jim Andrews.), em que cada planeta surge com um código dialéctico distinto (eu, ich, i).
Por toda esta animação, perpassa uma sensação de alienação. Esta alienação é reforçada não apenas pelas cores utilizadas e pelo som, mas também por algumas palavras (eu, sem sol, noite, sos) que têm uma conotação sombria.
A espacialidade (uma outra característica dos poemas de Augusto de Campos) colocada entre as palavras é um outro elemento do poema.
A forma como as palavras são evocadas pelo autor sugere um pedido de ajuda ao leitor, na esperança que este consiga aproximar as palavras conferindo às mesmas um maior sentido.
No poema-bomba há uma desintegração das palavras e uma consequente dispersão das letras constituintes. Estas letras, fruto da explosão, vão sofrer uma mudança nas suas formas.
Que tencionará o autor com este festim de cores, sons e formas?
Trata-se meramente de um exercício meramente estético ou haverá um significado implícito?
Na minha opinião, o autor através destas duas construções poéticas aponta para uma crítica.
Será o SOS uma crítica do autor ao actual estado literário e poético (uma condição linguística que se encontra menosprezado por grande parte do público?)?
Será a bomba que redefine as palavras "poema e bomba" como vimos no poema, a solução para a revitalização da poesia?

"SOS" de Augusto de Campos

Só pelo nome do poema de Augusto de Campos percebemos que se trata de um pedido de ajuda por parte de alguém. O som juntamente com as primeiras imagens que aparecem colocam-nos num contexto espacial, num espaço vasto e infinito. Quando começa a aparecer o poema deparamo-nos com a idéia de “ego”, “eu” em várias línguas como que se, trata-se apenas de uma pessoa mas sim, com várias pessoas em diferentes partes do mundo. A idéia que me transmite é de que num universo (mundo) tão cheio de pessoas nos podemos sentir muito sós, principalmente com o cair da noite quando tudo se acalma e nos encontramos sozinhos com nós próprios.É neste momento em que se dá este silencioso SOS, este silencioso sentimento de que estamos sós à procura de um sentido.

SOS, Augusto de Campos

Este poema começa por sugerir ao leitor o universo. As letras amarelas que vão surgindo num fundo negro sugerem o aparecimento das estrelas, e os movimentos que vão criando sugerem o movimento dos planetas. Também o som nos remete para um ambiente espacial, como se estivéssemos no interior de uma nave. À medida que o poema se vai construindo a ideia de universalidade cresce também através da escrita da palavra "eu" em várias línguas. Na minha opinião este poema retracta um pedido de ajuda de um individuo que se sente só no universo ao aperceber-se da efemeridade da vida e de como somos tão pequenos neste tão grande universo. Um individuo pode estar rodeado de pessoas, mas se nos faltar o nosso pequeno mundo tudo à nossa volta vai parecer gigantesco e vamo-nos sentir sozinhos. No final do poema tudo culmina na palavra SOS, que pode ser um pedido de ajuda directo, mas acrescentando um acento se transforma na palavra SÓS. Tendo em conta todos os poemas que analisámos de Augusto de Campos, mais uma vez verificamos que ele joga com o som e a imagem de modo a passar ainda melhor a mensagem por detrás do poema.

quarta-feira, março 14, 2007

"Enigma n", Jim Andrews

À primeira vista este texto parece-nos algo estático, no qual apenas se visualiza a palavra "Meaning". No entanto, e enquanto pertencente à categoria de literatura digital, trata-se mais do que isso. O autor pretende definir "Meaning" e como este é apresentado na literatura.
Ao olharmos para o texto, podemos ver que este conceito está em constante movimento, tal como o sentido da linguagem o está.
O sentido de um determinado conceito/palavra está em constante movimento, na medida em que nada garante que a mensagem que é trocada através desse significante nao provoque ambiguidade, a não ser no caso das terminologias, nas quais à partida se estabelece um significado para cada significante.

Enigma n

“n” de infinito. A disposição de uma palavra em muitas outras diferentes, incluindo esta disposição a mudança da cor, do tamanho, da forma e do movimento das letras. Uma escrita para ser lida, mas mais importante ainda, uma escrita para ser vista.
Neste “Enigma n”, a palavra “meaning” é-nos apresentada de forma a que possamos “brincar” com ela, dando um “significado” diferente a cada resultado proveniente das experiências que nos são permitidas fazer ao longo de todo o processo criativo.

The Loch Ness Monster’s Song

Realmente a poesia não tem limites...
Edwin Morgan e o seu Monstro do Lago Ness são um dos perfeitos exemplos desta falta de barreiras. No poema que dá título a este meu pequeno texto, deparamo-nos com uma escrita que se distancia largamente do código de linguagem conhecido, portanto a sua leitura é deveras complicada, mas não impossível. Torna-se até interessante pois o leitor é convidado e desafiado a encontrar um sentido, decifrando de certa maneira o código.
Penso que este género de arte tem como objectivo mostrar ao leitor uma outra maneira de ver as coisas, para além das convenções já há muito conhecidas.
Imaginemos que estamos na pele do monstro de Lock Ness, um ser estranho ao quotidiano enfadonho das pessoas, alvo de constantes ataques à privacidade, repetidamente a sermos observados com olhos de “fome”, fotografados por milhares de turistas sedentos de novidade, todos os dias vistos como sendo uma experiência de laboratório. Decerto que nos sentiríamos revoltados e zangados.
Nesta espécie de poema, repleto de elementos onomatopaicos, conseguimos deduzir um sentido no texto: começa e acaba com um suposto som de água, o monstro a emergir do lago e no fim a voltar para o seu habitat. No corpo do poema podemos depreeder que se trata de um diálogo, ou simplesmente de um monólogo, onde a criatura mostra o seu desagrado em relação ao que representa para o mundo exterior – uma exibição!
Esta interpretação é possível pois a maior parte da informação necessária à compreesão deste texto está seguramente no título. Título este que nos direcciona para uma determinada leitura.

Jim Andrews' Enigma N

A primeira coisa com o utilizador se depara quando abre a pagina é um fundo escuro e apenas uma única palavra em inglês que, traduzido para o português, significa “significado”. Esta técnica utilizada por Jim Andrews faz com prestamos atenção aquela palavrinha (por em quanto).
Jim Andrews associou a esta palavrinha vários significados, fazendo com os seus leitores chegassem a interpretações ou a conclusões diferentes.
A interpretação que lhe dou tem haver com a ordem das letras que, estando ordenadas de uma determinada forma e respeitarem as regras gramaticais de uma determinada língua, formam uma palavra....uma palavra que seremos capazes de descodificar.
No ecrã também aparece varias opções que poderemos seleccionar. Isto faz com as palavras saiam do seu lugar original, fazendo com que a palavra perca o significado que nos lhe tínhamos atribuído. Eu penso que isto também poderá ter haver com a noção de ordem e caos. Dado que a palavra nos aparece ordenada, estável (tudo no seu sitio) e depois (ao seleccionar uma das opções) passamos a ter o caos. Através de Jim Andrews chegamos á conclusão de que as palavras podem ter vários significados associados

" The Loch Ness Monster's Song"

A primeira leitura de poema “The Loch Ness Monster’s Song” provoca logo um espanto, pois este esta escrito numa linguagem que nós desconhecemos. Na verdade, apenas o título e a pontuação permitem – nos entender que se trata provavelmente de um monologo de Monstro de Loch Ness. (Sssnnnwhuffffll?/Hnwhuffl hhnnwfl hnfl hfl?/Gdroblboblhobngbl gbl gl g g g g glbgl.) N o entanto, não sabemos se o monstro está contente ou se está triste e só a interpretação sonora do autor atribui um determinado sentido à obra. De facto, continuamos sem entender as palavras que o monstro produz mas ao menos conseguimos entender o seu estado emocional e, por isso, gostar ou não do poema.

terça-feira, março 13, 2007

Jim andrews - Enigma n

Esta animação poética de Jim Andrews revolve a partir da palavra "meaning", cuja tradução para português, significa significado, interpretação. Numa primeira visualização, o que notei mais foram as cores utilizadas na construção da animação.
Tal como nos outros poemas estudados, nesta composição, as cores parecem constituir um papel preponderante. O "background" negro sugere uma misteriosidade, algo desconhecido, apenas interrompido pela cor verdejante das letras que compôem a palavra "meaning".
Quando observei esta imagem inicial pela primeira vez, não pude deixar de lembrar-me do universo, de um sistema solar (as letras como corpos celestes).
Quando desencadeei a opção "prod" e as outras lembrei-me imediatamente do movimento de rotação da terra (e é curioso o facto da letra e (earth) a ocupar um lugar aparentemente central no movimento das letras).
É nesta fase que a palavra deixa de assumir um significado meramente literário (mas tenta assumir novas palavras com a criação de neologismos e anagramas), e assume um significado mais metáforico.
A palavra perde todo o sentido, mas nunca a sua solidez, nem a sua relação (cada letra orbita com outra e assim sucessivamente), o que sugere uma certa harmonia, assim como se passa com os elementos que compôem o nosso universo e a nossa terra.
A escolha da palavra "meaning" poderá significar a nossa obsessão em tentar modelar conceitos concretos a tudo o que nos é desconhecido e sobrenatural.
Já o éramos assim nos primórdios da civilização humana (basta analisar as teorias greco-romanas em relação às leis universais). Era um apanágio na altura e sê-lo-á até ao fim da nossa existência.
O excessivo racionalismo levou à criação de vários grupos subversivos que preferiam privilegiar as emoções e a espontaneidade na escrita (não apenas na literatura, mas também na arte plástica, música, cinema, enfim em todos os campos culturais) e talvez seja essa a mensagem primacial de Jim Andrews.
As palavras não têm que assumir apenas um carácter literário nem textual. É possível, (e agora mais que nunca) com as novas tecnologias atribuir outros sentidos (não apenas o literário) através de sons, cores, formas.

domingo, março 11, 2007

Sssnnnwhuffffll?

Quando damos a primeira olhadela ao poema "The Loch Ness Monster's Song", podemos pensar que alguma criançinha andou a brincar com o computador do seu irmão mais velho. Podemos até baralhar a hipótese de que alguém ficasse adormecido enquanto estava a trabalhar num importante artigo.
Chegamos a esta situação porque o escritor Edwin Morgan decidiu criar este poema num código que somos incapazes de decodificar: a língua do próprio Monstro do Lago Ness. Assim, se ficamos nessa primeira fase de observação não poderemos apreciar a obra do escocês.
Após da primeira toma de contacto com o poema, devemos fixar o nosso olhar no título do mesmo. Devemos relacionar a ideia que expressa o título com o conteúdo do texto. Devido a algumas normas de convenção, encontraremos pequenos detalhes que reconhecemos como os signos de puntuação ou a disposição das frases. Avançamos na nossa "investigação poética" e damos conta de que o que estamos a ler mentalmente é uma especie de dialogo.
Só faz falta mais um ingrediente para conseguir a interpretação geral deste poema. Este é a voz. Uma correcta interpretação e entonação ajuda-nos na tentativa de dar-lhe sentido à obra. Mesmo assim não conseguimos adivinhar o significado de cada palavra, de cada frase; mas podemos perceber que o monstro sai da água, que parece chateado, que gaguea um bocadinho... E o mais importante, podemos dizer se gostamos do poema que estamos a ouvir ou não.

sábado, março 10, 2007

"Enigma n"

"Enigma n" é de facto o expoente máximo das emoções poéticas isto porque é um poema extremamente amplo no que diz respeito aos significados que se lhe podem atribuir!
Se se reparar bem "Meaning" traduzido para português é significado, portanto o poema "enigma n" poderá ser tudo aquilo que o leitor quer e imagina!!!
Jim Andrews conseguiu de facto fazer através do mais simples aquilo que poderá ser o mais complexo que existe que é atingir os limites da imaginação e da criatividade humana se é que tem limites!
A corrente em que esta obra literária se insere é uma corrente plena de liberdade criativa de combinações de emoções, sentidos e que consegue romper com a ideia convencional que se tem de poesia e de poema!!!!!

EnigMa N & MEaNing

What's the meaning of "Meaning"?
Qual é o objectivo, o que significa esta obra de Jim Andrews?
À partida, demonstra ser um verdadeiro enigma.
Após rever esta animação e após alguma reflexão, parece-me ter encontrado solução, ou, pelo menos, uma hipótese. Torna-se confuso de explicar e de fazer compreender, mas até poderá fazer algum sentido.
Em primeiro lugar, vimos que surgem no visor as letras M E A N I N G que, antes de mais, são as mesmas letras que compõem a palavra "enigma". Inicia-se a relação. De seguida, reparamos que existem várias opções (colorir as letras, faze-las girar mais depressa, "congelá-las", etc.) e que, cada uma delas, surge na sequência da anterior. Só sabemos a opção seguinte depois de termos accionado a anterior. Quer dizer, é mais um enigma, a descoberta do que está para vir.
Depois, quando seleccionamos uma determinada opção, a palavra "meaning" ou, individualmente, as suas letras são cobaias da interacção, da vontade do utilizador e "reagem".
É aqui que nos apercebemos do que acontece em "Discombobulate" ou em "0/1", por exemplo. Apercebemo-nos do que querem dizer essas expressões... their meaning...Podemos reconhecer aqui a relação linguística entre o conceito e o seu significado.
No fundo, creio que aquilo que serve de título a esta obra é o próprio sentido da acção que ocorre as nossos olhos. "Meaning" serve para explicar ao utilizador as opções que escolheu, é o seu palco, é a sua explicação, o seu significado em movimento.

sexta-feira, março 09, 2007

Augusto de Campos - Tensão

Encontro-me pela sexta vez consecutiva a ouvir a versão sonora do poema e é quase hipnotizante o ritmo e a melodia que Augusto de Campos impôe no poema.
A versão textual é praticamente indecifrável (assim como grande parte dos poemas concretos), mas talvez fosse essa a intenção de toda a poesia concreta...reinventar o modelo de construção poético e tentar glorificar e louvar a palavra através do som.
As palavras faladas possuem uma carga emotiva mais forte do que as lidas em silêncio.

Pome poem de bp nichol

Sempre fomos ensinados a definir um poema como “uma obra literária apresentada geralmente em verso”. No entanto, o texto da autoria de Bp Nichol, que foi objecto da nossa atenção demonstra – nos que o poema é algo mais do que isso ( What is a poem inside of your body/ what is a poem inside of your fingers/ what is a poem inside of your belly/ what is a poem inside of your ears...).Assim, segundo ele, o poema é mais do que uma simples escrita, é o nosso próprio corpo, o som, a respiração, os nossos sentimentos e a nossa forma de ver o mundo e as pessoas que nos rodeiam ( What is a poem inside of your head...).Deste modo, o poema permite- nos conhecer os outros e, principalmente os seus sentimentos, e deixa aos outros conhecer- nos, os nossos sentimentos, pensamentos, enfim o nosso mundo interior.

A Nova Era

A particularidade deste blog é dar a conhecer aos seus utilizadores, quer sejam alunos da cadeira de Literatura e Media na Era Digital, quer sejam meros exploradores e "cybernautas", o novo mundo da literatura, da informação e da arte expandidas pelo meio digital.
A era da modernidade trouxe consigo novas tecnologias e arrastou os tão discutidos desinteresse pela leitura impressa, desvalorização de artistas plásticos e poetas, e conferiu-lhes um novo estatuto muito mais versátil, complexo e renovado.
Se atentarmos para o conto "Amor", de Clarice Lispector, e para a reprodução do mesmo a partir da criatividade de Rui Torres, apercebemo-nos disto mesmo. A mesma realidade trabalhada a partir de diferentes estruturas, meios e materialidades.
A diferença está, precisamente, na forma como o leitor recebe a informação, se através da palavra escrita, se através de imagens de objectos concretos, reais ou abstractos, se através de vídeos, música ou voz, nomeadamente.
Estes meios originam diferentes perspectivas da mesma realidade, despertam novos estímulos aos nossos sentidos e causam diferentes reacções e interpretações.
É esta a alternativa que o mundo digital oferece aos exploradores da nova era, como o provam as obras de Lispector, Rui Torres, Ana Maria Uribe, bp nichol, e todas aquelas que ainda estão por descobrir.
Abre as portas para um novo e vasto mundo, que outrora estava restringido ao texto impresso em papel... um mundo onde tudo é possível.

Augusto de Campos, dias dias dias (1953)

Augusto de Campos, tensão (1956)

quinta-feira, março 08, 2007

A poesia concreta(de Augusto de Campos).

Os inícios históricos da poesia concreta dão-se nos anos 50. Como plano estético, a poesia concreta foi um impulso ideológico importante no desenvolvimento das artes na metade do século XX.
Usando recursos visuais como a disposição geométrica das palavras na página, a aplicação de cores e de diferentes tipos de letras, na poesia concreta, o visual e o espaço têm o mesmo nível de importância que a rima
e o ritmo.
Este género de poesia permite várias interpretações e percepções da parte do leitor. Apresenta-nos um percurso multisequencial (onde o leitor pode decidir de livre vontade o seu próprio caminho de leitura) sendo assim permitida a maximização das possibilidades dessa mesma leitura. Não existe uma ordem específica nem pontuação, bem como conectores de linguagem.
O carácter icónico é também uma identificadora característica desta poesia – o poema é acompanhado de uma disposição pensada de palavras, criando assim uma imagem que transmite o sentido do próprio poema.
É uma poesia que nos deixa a pensar e a digerir o que acabámos de visualizar, sendo por isso necessário, por vezes, uma segunda leitura.

O que é um poema?

Convencionou-se que um poema é uma obra literária apresentada geralmente em verso (ainda que possa existir prosa poética, assim designada pelo uso de temas específicos e de figuras de estilo próprias da poesia), uma obra que pode conter rima, ou não. Assim fomos ensinados e tudo o que se afaste desta convenção torna-se estranho.
No entanto, a poesia é muito mais…enquanto que um poema escrito é um objecto literário com existência material concreta e objectiva, a poesia pode ter um carácter imaterial e transcendente
, onde a linguagem humana é utilizada com fins estéticos.
Com a influência do Modernismo - movimento cultural, surgido na Europa que buscava ruptura com o classicismo, o ritmo dos versos foi liberalizado e temos os chamados "versos livres
" que não seguem nenhuma métrica.
Fortemente relacionada com a música, a poesia tem as suas raízes históricas nas letras de acompanhamento de peças musicais. Tal como na
música, o ritmo de um poema tem uma importância fulcral.
Um poema não é apenas um processo exterior, de ser escrito num papel e lido. É algo que vem de dentro e que está presente no ser humano, no seu todo, quer seja nas diferentes partes constituintes do corpo, no estado de espírito, nos sentimentos do momento, na voz ou na respiração.

quarta-feira, março 07, 2007

O que é um poema?

Como diz bpNichol, um poema é o conjunto do nosso corpo e dos nossos sentimentos.
É uma forma de transpormos para o papel, e dar-mos a conhecer aos outros, todos os nossos pensamentos, desejos, angústias, alegrias…
Um poema tem no seu interior um reino de potencial puro. A partir desse lugar tudo é possível.
Pode ser visto como uma forma de encararmos a realidade profunda que está por detrás da ilusão da vida quotidiana. Torna possível alcançar a “realização” dos nossos desejos.
A construção de um poema exige um acesso proveitoso a um lugar profundo dentro de nós, ao mesmo tempo que nos desperta para as coincidências do mundo exterior.
O poema é uma tela pintada…é sonho…imaginação…
Poema é vida!

terça-feira, março 06, 2007

“Pome Poem” de bpNichol



Segundo bpNichol, “What is a pome? It’s inside your body, body, body, body. What is a pome? It’s inside your head, inside your head…”, logo existe não só em todas as partes do nosso corpo, como também em todas as acções e estados de alma que nós temos e sentimos ao longo da nossa vida.

Assim, o poema é muito mais do que palavras escritas num pedaço de papel. Este, pode ser, o nosso próprio corpo, o som, a voz ofegante da pessoa que o lê. Servindo-se assim de qualquer conjunto de suportes, sendo estes o som, a voz, a imagem, e até mesmo a dança para chegar á sua finalidade.

Um bom exemplo foi a forma como o projecto “The Four Horsemen” interpretaram este “Pome Poem” de bpNichol como mostra a imagem.

Pome Poem bp Nichol

A noção do poema é diversificada, depende do estado de espirito e sentimentos da pessoa (whatis a poem is inside your heart... happy...), dos pensamentos(what is a poem is inside your head..)e das realizaçãoes.
O nosso corpo é o material que constitui o poema.. De uma forma geral pode se dizer que o poema existe em nós e é uma forma de deixar os outros conhecer-nos.O poema torna se sobre aquilo que estamos habituados a ver(what is a poem is inside your eyes....)e as nossas experiências de vida. O poema se manifesta não só pela escrita mas tambem pela voz e movimentos das partes do corpo dando lhe assim uma maior expressividade e clarificando o seu sentido.

domingo, março 04, 2007

o poema a surgir não obsessiva mas naturalmente.

Em «Pome, poem», bp Nichol afirma que o poema existe em todo o nosso corpo, mais pormenorizadamente em cada uma das partes pelas quais este é constituído. Afirma também, que o poema existe de igual forma e com igual intensidade em cada um dos estados de 'alma' que nos possam acolher. Esta essência poética da vida vem suportar a ideia de que o poema não precisa de existir num só lugar, não precisa corresponder obsessiva e inevitavelmente a um só estado de alma.
O poema pode sair, sentimentalmente, do nosso coração, num estado apaixonado. O poema pode sair da nossa cabeça (ideia de racionalidade), impondo um ideal e/ou uma argumentação. Em ambos os casos, bem como nas demais situações, o poema não tem obrigatoriamente de sair directamente de um dado lugar para o papel. Existindo uma pluralidade de origens que podem ser a origem do poema, existe também uma pluralidade de meios onde o poema pode surgir.
Assim, é dismistificada (ou talvez seja antes mistificada) a ideia de o poema não tem de seguir as formas rígidas que o papel lhe dita, podendo adaptar-se a outras realidades que melhor sirvam o seu propósito. O poema, bem como toda a literatura, pode, pois, surgir no papel (conto "Amor"), mas pode também, se assim o desejar, revelar-se no meio audio ("Pome, poem") ou até num simultanemente plural conjunto de suportes ("Amor de Clarice "). O poema pode surgir onde nós queiramos que ele surja. Mas, se existe no ar que respiramos, não poderá ele surgir por si mesmo?

(ouça duas vezes, e fique com o poema na cabeça,
nos dedos, no umbigo, no coração, nos olhos, no nariz, nos dedos dos pés, nos ouvidos, nos lábios, )

sábado, março 03, 2007

"Pome poem" bpNichol

Pome poem de bpNichol desafia a Arte, incita a forma tradicional de escrever poesia e estica os limites poéticos na sua forma de apresentação.
O poema favorece a afirmação de que a palavra falada move-se em vários caminhos e alguns deles contraditórios
A narrativa expressiva recorda os primeiros poemas proclamados do movimento DADA e o seu som natural e puro é consequência da perfeita união experimental, entre o texto e a voz.

"Amor" de Clarice Lispector

"Amor" de Clarice Lispector retrata uma mulher, Ana, que se encontra de facto num estado de depressão interior.
No entanto é essa rotina interior em que se encontra que de alguma forma a faz esqueçer um pouco as frustrações presentes em si!Ana é apenas o reflexo daquilo que é a grande maioria das pessoas, demasiado agarradas a uma rotina para se lembrarem que há vida além dessa rotina!
Ana era alguém demasiado vazio, oco!Isto porque quanto a mim Ana "não vivia, apenas existia"!
As frustrações vividas por Ana são bastante visíveis através da expressao "certa hora da tarde era mais perigosa" isto é quando já não havia rotina em que tudo estaria feito,é então que Ana reflectia e se dava conta do vazio em que vivia!
No entanto há uma situação que de alguma forma irá afectar de forma especial Ana situação essa em que Ana se depara com um cego o que vai despertar em si um sentimento de pena, piedade o que de alguma forma vai tornar o mundo num "mal estar pesado" este acontecimento vai afectar de tal forma Ana que esta vai esqueçer o caminho para casa!
Já mais tarde Ana vai estar de novo preturbada quando depara com toda a beleza do Jardim Botânico e simplicidade daquela paisagem!É entao que Ana é de novo assaltada pela obrigatoriedade de cuidar de casa e dos filhos e marido e mais uma vez tudo retorna á rotina!
Em conclusão imagino o que irá no pensamento de Ana:"O que me resta da vida? Como é estranho, só me resta aquilo que dei aos outros!"

sexta-feira, março 02, 2007

Vozes de Tuva

Na última segunda-feira do mês de Fevereiro, dia 26, o TAGV recebeu (não pela primeira vez em Portugal!) os mestres da sofisticada arte do “throat singing” – os Chirgilchin – Oriundos de Tuva (situada na Ásia Central, entre a Mongólia e a Sibéria), trazem-nos uma música ancestral, de montanha, pura e de efeitos sublimes, assemelhando-se em parte à música mongol e aos cantos budistas tibetanos.
Esta é uma forma de canto tradicional que se baseia numa elaborada técnica de exploração das cordas vocais, manipulando o volume e timbre com a posição da boca e da língua.
Os responsáveis por esta arte causaram grande impacto por onde passaram e decerto que Coimbra não foi excepção…como opinião pessoal, não superou as expectativas pois elas estavam desde início altas. Estava certa de que iria ser um bom espectáculo e com grande qualidade. Como de facto, gostei imenso e saí com um grande sorriso satisfeito .
Sem dúvida, uma das mais fascinantes formas musicais!

quinta-feira, março 01, 2007

Amor de Clarice Lispector

A vida de uma "ordinary woman". Uma dona de casa que tem um mundo reduzido e com uma inquietação interna mas que agarra a seu mundo doméstico pelo amor ao marido e aos filhos, colocando de lado o amor próprio. A persistência da vida mesmo sem a satisfação necessária.
A Ana vive numa rotina que não trazia a felicidade mas que acalmava a sua inquietação ou perturbação. As tarefas domésticas não deixavam que a sua inquietação fosse apercebida por outros ou por ela mesma. Então quando não fazia as tarefas a perturbação interna voltava nela. Assim é o momento em que ela observe-se que há um certo vazio na sua vida."certa hora da tarde era mais perigosa."
Incluído na rotina dela, as poucas saídas do circuito caseiro, despertava nela o espírito de inquietação. No autocarro, ao ver o cego, desencadeou a inquietação e também um certo sentido de piedade. " Teria esquecido de que havia cegos? A piedade a sufocava, Ana respirava pesadamente...o mundo se tornara de novo um mal estar." Esse acontecimento fez com que ela ficasse mais perturbada até ao ponto de esquecer o caminho de retorno a casa.
Na sequência, um outro acontecimento, a chegada ao jardim botânico veio a contrariar o mundo que ela vivia ou pensava. O jardim botânico desprende -lhe dos confins da casa, da monotonia... "o jardim era tão bonito que ela teve medo do inferno". Mas lembrando nas crianças trouxe a sua mente a obrigação de voltar. O amor pelos filhos e marido prevalece.
As vezes a vida é vivida dando vida a vida dos outros esquecendo da sua própria vida.
Fazemos a vida dos outros a nossa vida e isso muitas vezes leva ao vazio da vida.