terça-feira, fevereiro 28, 2006

vídeo-clip "Evil", dos Interpol

O que acontece neste vídeo?
Qual a narrativa das imagens?
Qual a narrativa da letra da canção?
Como se combinam entre si?
Qual a relação entre imagens fotográficas e imagens digitais?
Como caracterizar a personagem animada?


a perspectiva em perspectiva

A fonte no meio do jardim, com a estátua, a disposição geométrica do jardim central, o muro de pedra ao fundo num plano mais elevado, as árvores em redor - todos estes elementos sugerem um jardim neoclássico, de inspiração no jardim renascentista italiano ou no jardim neoclássico francês. O jardim geométrico representa, aliás, uma digitalização do real, que matematiza a disposição e a forma das plantas para conformá-las a modelos abstractos. Com este enquadramento espacial, o anúncio da Samsung Camcorder activa a memória dos dispositivos de representação pós-Renascentista. A perspectiva linear, enunciada no tratado De Pictura (1435) do arquitecto Leon Battista Alberti (1404-1472) e desenvolvida pelos pintores italianos do século XV, assim como o realismo cromático e a tela como janela sobre o mundo são directamente evocados através desta contextualização. É como se o potencial de figuração do código naturalista do Renascimento se realizasse em grau superior nas capacidades pictóricas da câmara digital. Esta composição constitui um tratado neo-naturalista em defesa da transparência e da superioridade da representação digital. Todos os elementos da imagem estão compostos de modo a respeitar a linha de fuga e a linha de horizonte prescrita pelas leis matemáticas da perspectiva (designadamente nas escalas relativas dos elementos, nas sobreposições de planos, nas relações entre texturas e distâncias). Há, no entanto, uma significativa violação da natureza imediada e realista da representação: a presença da própria câmara digital, que paira, inexplicavelmente, sobre a vegetação. Aquilo que parece permanecer oculto à caçadora de borboletas, está afinal à vista de todos: o meio que determina as propriedades da imagem.

por exemplo, um jardim

sábado, fevereiro 25, 2006

lepidópteros e entomologistas: o voo da câmara

A câmara está para o insecto como a rede para a câmara. A Samsung Camcorder introduz a confusão ontológica entre objecto e representação. A caçadora da borboleta torna-se na caçadora da imagem da borboleta, ela própria duplo da representação da borboleta no écran de visualização da câmara. Para o leitor do anúncio, a figura feminina é uma borboleta em segundo grau. Neste caso é a metáfora a máquina que produz esta segunda imagem da borboleta: a borboleta replicada na figura da mulher. A posição da imagem da mulher imita, estruturalmente, a posição e a anatomia da imagem da borboleta. A cabeça destaca-se do corpo humano de forma semelhante à da cabeça do corpo do insecto. Os dois pares de asas têm equivalente nos dois braços e no balão do vestido. A orientação relativa dos corpos faz-se por paralelismo e projecção homotética. A figura feminina é assim imagem da borboleta que a câmara capta, do mesmo modo que esta seria imagem da borboleta real algures no campo de visão da câmara, mas fora da imagem. O facto de a câmara apontar para a frente, para o plano externo ao plano da folha de papel em que a imagem está impressa, acentua o efeito de real de toda a composição. É como se a borboleta estivesse algures no espaço tridimensional onde está o leitor que segura a folha de papel na mão. Capturar o mundo deste modo significa criar a ilusão de que o meio e o real não se distinguem. De que a transparência da representação permite substituir a borboleta pela imagem da borboleta. A caçadora foi enganada. Mas o leitor talvez não: a rede está prestes afinal a apanhar o meio, o medium. Câmara digital: tecnoborboleta que voa sobre o mundo.

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

por exemplo, uma borboleta

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

o que é capturar o mundo com uma câmara digital?

O anúncio da Samsung Camcorder desafia a nossa imaginação a responder àquela pergunta. O mundo capta-se (captura-se) com imagens? Como é que isso se faz? Capturar (captar) o mundo, mesmo com a câmara, é ainda "imaginar capturar o mundo". Ou seja, é uma imagem em segundo grau. A imaginação terá em relação ao mundo a mesma relação que a câmara? O exercício que proponho é tentarmos desdobrar esta imagem nos seus múltiplos reflexos. Vê-la como imagem cheia de imagens encaixadas, umas dentro das outras. O que é capturar o mundo assim?

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

imagine capturing the world in one tiny package

bp Nichol, pome poem (1972, 1982)

O texto de bp Nichol interroga a natureza do poema. What is a poem? A poem is. O que é um poema? O próprio poema é a resposta a essa pergunta: a sua materialidade fonética é contígua à materialidade do corpo. O que o poema é, é-o dentro do corpo, da cabeça, dos dedos das mãos, dos dedos dos pés, do ventre, do coração, dos olhos, do nariz, dos ouvidos, dos lábios, da voz, da felicidade, da mágoa, do amor, do sopro. A repetição das palavras faz o corpo participar do ritmo da linguagem e vice-versa. A distinção entre meio e mensagem parece quebrar-se: o sentido das palavras está na matéria das palavras. O que o poema é, é dentro do corpo, participa da sua materialidade. O registo áudio acentua essa ideia de que o sopro do barro não se distingue do barro. Por outro lado, pode perguntar-se: o que é que aconteceu ao poema quando foi registado? Como é que o poema foi capturado pela gravação? Que corpo tem ele agora quando se transformou num registo acústico de ondas sonoras?

sexta-feira, fevereiro 17, 2006

Augusto de Campos, eis os amantes (1953)

O que é um medium?

A linguagem é um medium?
O corpo é um medium?
O médium é um medium?
A escrita é um medium?
O livro é um medium?
O computador é um medium?
O poema é um medium?
A canção é um medium?
O vídeo é um medium?
A forma é um medium?
A tecnologia é um medium?

Ian Hamilton Finlay, acrobats (1964)

Literatura e Media na Era Digital

DigLitMedia é um blogue associado à disciplina Literatura e Media na Era Digital. Constitui um fórum de escrita que alarga à esfera pública electrónica a reflexão levada a cabo nas aulas. Se conseguir o nível de participação e de reflexão que se imagina, poderá ser uma espécie de diário dos pensamentos em construção e, não menos importante, uma amostragem de criações digitais em linha. Seis temas circunscrevem a escrita deste colectivo de escrita:

TEMA 1: O que é um medium?;
TEMA 2: Códices e computadores;
TEMA 3: Práticas artísticas inter-media;
TEMA 4: Máquinas que escrevem;
TEMA 5: Poesia digital;
TEMA 6: Ficção digital.

Kurt Schwitters, The A Book (1942)