quinta-feira, julho 06, 2006

E agora?

E agora?
Fim de ano, a cadeira está feita, chegam as férias...
Será o fim? Da cadeira, das aulas, do Diglitmedia.blogspot?
Costuma-se dizer que o fim de algo significa sempre o início de outra coisa. O que significa o fim da cadeira, o (prevísivel) fim do Diglitmedia.blogspot? Que início é que este fim proporciona?
É, antes de mais, inegável o contributo formativo da cadeira; todos acabamos este semestre com outros conhecimentos que não possuíamos no início.

quarta-feira, junho 07, 2006

«Under the Milky Way»

Por exemplo, o vídeo-clip que Lourenço Teixeira escolheu. O vídeo-clip dos The Church realiza uma poética remediação da canção de amor, combinando a linguagem do concerto rock com a linguagem do ballet clássico, da acrobacia e dos desportos radicais. O pas de deux entre motociclista e bailarina, ao aproximar duas gestualidades distantes, encena em performance o feixe de forças que a metáfora desencadeia ao aproximar realidades afastadas. Por seu turno, a coreografia imita a atracção orbital entre estrelas e grupos de estrelas, sugerindo a forma espiralada da galáxia. O fogo-de-artifício das bailarinas trapezistas suspensas emula a materialidade do fogo estelar. A música e as palavras são potenciadas pela sintaxe da acção em palco e pela montagem que o vídeo opera sobre essa acção. «I wish I knew what you were looking for» pode assim ecoar na mediação complexa e saturada de dança, música e filme que o vídeo-clip contém. É através deste intrincado jogo de formas, gestos e meios que ocorre a celebração da beleza do mundo e da atracção amorosa - debaixo da Via Láctea esta noite.

«Mad World»


Por exemplo, o vídeo-clip que Lourenço Teixeira escolheu. «Os sonhos em que me vejo morrer são os melhores que alguma vez tive» - diz um dos versos que reflecte a visão atormentada do adolescente psicótico. A canção de Gary Jules, a partir de Donnie Darko, dramatiza as intersecções de temporalidades alternativas que a narrativa propõe. A sua montagem recapitula sequências do filme, colocando o cantor na posição de um observador que, a partir do televisor, testemunha e narra a acção que se passa no mundo exterior. Inverte-se, de certo modo, a ontologia do observador, já que é a figura telemediada que observa e narra o mundo fora do televisor. A lógica onírica da obra original, em que o mundo mental e o mundo externo se confundem, é encenada através desta estratégia de remediação do filme no vídeo-clip. A loucura do mundo, que é a loucura da personagem, é assim materializada na sintaxe do vídeo, cujas sequências emulam a confusão entre acções, recordações, sonhos e visões. As imagens que acompanham a canção são um resumo do filme, mas ao mesmo tempo reflectem a lógica onírica da montagem rápida característica do vídeo-clip. Por outro lado, mostram como funcionam a narrativa e o cérebro humano: por justaposição e associação de imagens cujo nexo advém do próprio acto de as justapor e associar.

A lógica onírica da mediação (a propósito de Gary Jules, «Mad World», e The Church, «Under the Wilky Way»)


Admitamos, com Jay David Bolter e Richard Grusin, que a remediação e a hipermediação são as características essenciais do momento tecnocultural digital: por um lado, os meios seriam sobretudo re-meios, isto é, meios que medeiam outros meios; por outro, a intensificação e a autenticação da experiência dependeria da sua tecnomediação. Isto significaria que manipular o meio enquanto meio (desfazendo a confusão ontológica entre representação e objecto) e, ao mesmo tempo, participar corporalmente nessa imersão sensorial (diluindo a distinção entre mundo virtual e mundo natural, ou seja, tornar indistinta a fronteira entre representação e objecto) constituiria o paradoxo da experiência digital. O sonho cartesiano de reduzir o mundo material a uma descrição matemática criou representações e tecnologias de tal forma poderosas que o modo abstracto e modo concreto de representar o real convergem no meio digital. A escrita alfabética pode assim aliar-se ao som, à imagem e à imagem animada, redefinindo a literacia. Saber ler e saber escrever passam portanto a significar saber manipular e interpretar todas as formas que enxameiam e constituem o espaço electrónico. O dilema parece ser este: como usar o cibernético para conhecer o real sem reduzir o real ao cibernético? A digitalização do mundo é apenas uma tecnologia de simbolização ou será sobretudo uma forma de controlo e de vigilância?

terça-feira, junho 06, 2006

Trabalho Final

Trabalho Final de Joel Fernandes

Para concluir e porque "não há melhor fragata que um bom livro para nos levar a terras distantes"...

“A leitura de um bom livro é um diálogo incessante: o livro fala e a alma responde.”, André Maurois.
Não só a leitura de um livro, no seu significado comum, como também a leitura de uma obra noutros formatos, noutras dimensões. As obras em linha, que estudámos ao longo do semestre, elevaram a nossa imaginação e fizeram-nos descobrir um “admirável mundo novo” da literatura – a literatura digital.
É realmente verdade que travámos um incessante diálogo com estas obras que fomos analisando. Os textos falavam-nos, não só através das palavras, como também de animações, movimentos, sons, hiperligações que nos ligavam a diferentes sítios da Internet e todo um conjunto de “atrevidos” e originais mecanismos electrónicos. Enquanto isso, a nossa alma respondia através da interpretação dada pela nossa mente, de opiniões e visões diferentes, transmitidas pela escrita que fomos produzindo no blog.
Tudo isto foi possível por meio do fascinante mundo digital, do universo dos computadores e da Internet – a fragata que nos transporta por este peculiar mundo literário, até agora desconhecido…

segunda-feira, junho 05, 2006

PSIU!


Há pouco a minha irmã perguntou-me, depois de ver no fundo do meu computador o poema concreto Psiu! de Augusto de Campos, "então mas... se isso é um poema, por onde é que se começa a ler?".
Interessante, pensei. Um poema comum não lhe teria despertado qualquer interesse e muito menos a teria feito questionar-se, e questionar-me a mim, sobre o seu funcionamento.
Contudo se, se não o tivesse visto no meu computador, dificilmente teria contacto com ele.
Fiquei a pensar nisso... Por que é que a arte (de que este poema é exemplo), em vez de continuar a esperar que a vão descobrir, não se começa a revelar ela própria?
Por que é que não é feito um investimento nesse sentido? Afinal ela pertence-nos e é para nós que existe. A nós, a todos.
Só se ganhava em dá-la a conhecer "nas ruas", onde as pessoas estão; não se tratava, de todo, de a vulgarizar, como me parece que haja receio.
Isto é só, claro, a minha opinião...

domingo, junho 04, 2006

Nova forma de arte?

A internet veio revolucionar o mundo da informação, mas nestas aulas vimos que também poderá revolucionar a literatura, novas formas de poesia aparecem cada vez mais, novas ou alterando textos antigos, reinventando-os, acabando muitas vezes com o verso e ganhando na animação. a internet permitiu a inovação numa área que parecia não ter muito para inovar, a escrita passou a ganhar novos contornos e novas formas de ler, as formas de ligação entre as páginas web, seja ela labiríntica ou em forma de árvore, dá mais liberdade ao leitor para seguir o caminho que lhe convém e não aquele estipulado por um livro impresso. A qualidade das páginas web também tem evoluído para contornos mais artísticos, cada vez mais as páginas se tornam agradáveis ao olhar com uma miscelânea de côr, animação e som, fugindo ao hipertexto simples, aqui também se cria uma nova forma artística para mim, em sítios como o de Donnie Darko ou o de Arnaldo Antunes, em que só o entrar nessas páginas se torna uma agradável experiência estética.

quarta-feira, maio 31, 2006

O(s) sítio(s) de Donnie Darko (não aconselhável a quem ainda não viu o filme)


O filme Donnie Darko, realizado em 2001 por Richard Kelly, pejado de paradoxos e mistérios, não nos oferece uma leitura fácil, podendo assim dar lugar a múltlipas interpretações. Se não vejamos: é-nos dado a saber, no final do filme, que caso o protagonista, Donnie, não tivesse sido chamado por aquele ser grotesco disfarçado (ou não) de coelho e permanecesse em casa, o seu destino teria sido inteiramente diferente daquele que nos é dado a observar ao longo de quase duas horas de filme! Serão assim tão convincentes os momentos finais do filme? Em qual daqueles mundos, em qual daqueles sítios, em qual daquelas alternativas se poderá então (re-)encontrar Donnie? E, a haver, que desafios, que inovações e transgressões poderemos (re-)descobrir nesta busca? E em que medida poderá este processo de busca levar-nos ao encontro de outros meios para lá do filme?


Talvez seja, então, pertinente tentar re-visionar, resumir e re-organizar um pouco desta história, para que a passo e passo se construa uma (minha) resposta/alternativa.

A dois de Outubro de 1988, a meio da noite, Donnie é acordado por uma voz que o impele a sair de casa e a dirigir-se até a um campo de golfe. É aí que Donnie encontra um ser grotesco, mascarado (ou não) de coelho, de seu nome Frank, que o informa de que o mundo está prestes a terminar dentro de 28 dias, 6 horas, 42 minutos e 12 segundos... Nessa manhã, Donnie acorda ainda no campo de golfe e, ao regressar a casa, percebe que um motor de um avião, vindo não se sabe muito bem de onde, tinha aterrado no telhado da sua casa, mesmo em cima do seu quarto! A partir daqui, começamos a assistir ao desenrolar de uma série de acontecimentos, no mínimo bizarros, que nos fazem avançar, nomeadamente, a suspeita de que algo de errado se pode passar com a sanidade mental de Donnie. Suspeita esta, que, se nos lembrarmos, é confirmada pela irmã que, zangada, o acusa de não ter tomado uns certos medicamentos. Mas, ler o filme sob o prisma da esquizofrenia, da psicose (que explicaria Frank como sendo uma das muitas alucinações de Donnie) não seria/será, talvez, demasiado imediato e redutor?





"A storm is coming," Frank says, "A storm that will swallow the children." And I will deliver them from the kingdom of pain. I will deliver the children back to their doorsteps. (I'll) send the monsters back to the underground. I'll send them back to a place where no one else can see them. Except for me. Because I am Donnie Darko.1

Quem é então Donnie Darko?

Urge um re-visionar, um re-ler, quiçás, uma viagem de navegação no tempo ou por outros novos mundos... futuros, ou não...

(to be continued)

1 In Donnie Darko: The Director's Cut. Richard Kelly. USA. 2004

Do you believe in Time Travel?



Time travel: "is the concept of moving backward or forward to different points in time, in a manner analogous to moving through space. Additionally, some interpretations of time travel suggest the possibility of travel between parallel realities or universes."

Some theories are applied concerning time travel and all suggest that spacetime, or kinds of motion in space (if possible), will allow time travel into the past and future. There's a theory that sustains that time appears more slowly for faster-bodies, like for example, a moving clock will appear to run slow; as a clock approaches the speed of light its hands will appear to nearly stop moving. The effects of this sort of time dilation are known as the twin paradox.

Some other (fragile) theory sustains only that time travel toward the future: never backward. However, there are thinkers who argue that all the matter of the universe only exists in the present moment. Thus, if one were to travel back from the "present" to an earlier time, none of the material universe would be found there, because it will have remained in the present. Regarding a 4-dimensional spacetime, the traveller would have travelled "back" to an area of spacetime corresponding to an earlier value, but none of the other particles that form the universe will have done so, so the traveller finds precisely nothing when arriving back at the earlier time, which eliminites all the paradoxes about time travel.

Let us suppose that one could even go back in time. Returning back what would happen to the traveller if he/she killed his/her biological grandfather before he met his wife (our traveller's grandmother)? Then if the traveller did that, he/she would never have been conceived, so allowing traveller to go back in time isn't possible at all.

Another resolution seems to appear to solve/confuse more this problem. This theory holds that if one were to travel back in time, the laws of nature (or other intervening cause) would simply forbid the traveller from doing anything that could later result in their time travel not ocurring. Taking the example above, a shot fired at the traveller's grandfather will miss, or the gun will jam, or misfire, or some other event will occur to prevent the attempt from succeeding. With this, traveller will be unable to change history.

Opposite to this, we can regard this example: if one traveled back to the year before its birth to kill its parents and prevent its birth in the next year, that one wouldn't disappear from history, because simply by travelling back to the year before its birth, that persona would have established that he/she already existed in its adult form, complete with memories, in the year before its birth. In effect, traveller would have prevented nothing but a redundant, younger copy of itself from co-existing with him/her. Going back in time to prevent the premature existence of itself would likewise only push back the time at which the existence of itself was historically established.

One thing we could be certain (at least we want to believe in it), we live in our present with memories of our past and projecting our future to come, of course we could doubt about the veracity of that past memories or even doubt if they truly ever existed or was/has been our mind that has been creating it. But we must rise our heads and live Under our Milky Way, while we (still) have Time.

De Shelley Jackson "O Corpo" "Humano" dos Mão Morta

Já falamos do "Corpo" de Shelley Jackson. Como se olhasse num espelho, a autora parte da contemplação de uma parte do seu próprio para uma reflexão da própria existência e condição humana.
O texto que apresento é uma letra de uma música da banda Mão Morta. Nele, o autor, de igual modo, parte de uma contemplação para uma auto-contemplação e daí para uma reflexão ontológica. Chamo especial atenção para a parte final do texto, com citações de William S. Burroughs.

HUMANO[Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro]
Um casal de pegas rabudas faz o ninho em frente à minha janela - todas as manhãs sou acordado pelo seu intenso grasnar e fico a vê-las trazer pauzinhos com o bico - acho que é um sinal de boas-vindas ter dois passaritos assim expostos na sua intimidade - é como se me dissessem "eis um bom lugar para começar tudo de novo. fazemos-te confiança…" - o marroquino do bar da esquina recebe-me sempre com um rasgado sorriso e um caloroso aperto de mão - de vez em quando oferece-me mesmo as bebidas - está outra vez a chover - chove muitas vezes - uma chuva miudinha, que mal se sente e que não impede ninguém de sair de casa - nestas alturas o céu fica pesado, cor de chumbo, a tocar os telhados - é quando eu mais gosto de ir à deriva, levado pelas sombras que aqui e ali afloram em determinadas ruas - no outro dia encontrei...

Why can't you just get physical like a human
Não foi bem uma vista aérea, foi uma coisa estranha, como se estivesse em cima...
Why can't you just get physical like a human
Uma espécie de aldeia em miniatura, que eu percorria por dentro estando fora...
Why can't you just get physical like a human
É como se olhasse para as minhas botas e as visse dentro dos meus pés, apesar de calçadas...
Why can't you just get physical like a human
Era como se eu fosse maior do que o que sou - como se estivesse todo dentro de algo mais pequeno do que eu - dentro e fora em simultâneo, porque ao mesmo tempo que cabia lá dentro era maior do que aquilo em que cabia - uma espécie de ilusão física - de anulação do volume - ou de inibição do impossível - uma abstracção indizível...
Why can't why can't why can't you just get physical like a human
Why can't why can't why can't you just get physical like a human
Why can't why can't why can't you just get physical like a human
Why can't why can't why can't you just get physical like a human
Why can't why can't why can't you just get physical like a human
Why can't why can't why can't you just get physical like a human
Well the buyer comes look more more like a junkie can't drink can't get it up his lips falls down

Donnie Darko

Esta é uma obra de ficção bastante interessante. É formada por três níveis e parece uma história de suspense/ mistério, em que o leitor tem de estar atento à mudança de imagem e às palavras que vão aparecendo pois algumas servem de pass para se entrar no nível seguinte. É um bom exemplo da interacção do leitor com a obra.

Carta de Condução

Atingir a simplicidade por vezes é dificil mas proponho-me hoje a tentar...
Numa obra de literatura clássica, "normal", um caminho pré-definido é apresentado, aceite e percorrido. Não interessa quantas voltas e reviravoltas ele dá porque serão sempre as mesmas cada vez que se repetir. Está fixo, imutável.
O que a hiperficção genericamente e a obra literária "Hegirascope" em particular difere é na escolha permitida ao leitor. O leitor pode e deve decidir por entre vários percursos possíveis, fazendo virar, inverter a marcha, aumentar a velocidade, parar, o que quiser. O leitor está em controle do "veículo" literário que comprou e pode percorrer livremente as estradas que lhe são propostas. Finalmente a repetição da leitura permite abordar novo caminhos que não os previamente escolhidos.
O leitor torna-se condutor.

sexta-feira, maio 26, 2006

"Strings" that hold you

São as "cordas" de Dan Waber que nos agarram numa disputa, no amor; as mesmas que nos colocam em posições bipolares para podermos chegar a uma consenso.
Assim, através de uma construção cinética o nosso olhar balança entre um "yes" e um "no", intercalados por um "maybe" somos conduzidos para uma suposta relação amorosa entre o "yes" e o "no".
Á medida que acompanhamos os pequenos capítulos de "Strings" compreendemos a importância do movimento da "corda" ao formar as palavras para uma interpretação e precepção lógica do leitor. De facto, o meio digital, proporciona um carácter imagético às palavras em movimento, quase como se estivessemos a ver duas pessoas a discutir, a apaixonar-se...

"Hegirascope", a hiperficção

Faz todo o sentido estudar esta obra por esta altura. Hegirascope é uma suma das principais características de uma leitura digital.
Trata-se de um texto que contém quatro ligações. Cada uma destas tem outras quatro ligações, e assim sucessivamente. Contudo, caso não seja o leitor a tomar a iniciativa de mudar de página, o temporizador do site encarrega-se de o fazer passados 30 segundos. Esta propriedade torna o texto digital independente do seu leitor, liberta-o da tomada de todas as decisões - o leitor pode escolher guiar ou deixar-se levar pela obra.
Hegirascope é, por estes e outros motivos, uma obra sobre a hiperficção. Não só pela forma como está organizado como também pelo conteúdo. Acima de tudo, faz-nos pensar sobre ela. E a hiperficção é um género ainda pouco divulgado.
Tentámos descobrir o porquê e a justificação mais plausível pareceu-nos ser a de que ainda não teve tempo suficiente para criar as suas próprias convenções e, consecutivamente, criar um legado de leitores. Mais. O Homem não tem, na hiperficção, a facilidade de não ter de organizar a história numa sequência lógica, tem de interferir na sua construção, mais do que na sua interpretação apenas. Com o rápido desenvolvimento dos meios digitais que tem vindo a ocorrer, parece-me, a situação acabará por mudar, tal como o nosso papel enquanto leitores.

Problemas de interpretação/expressão

É sempre complicado expormos os nossos pensamentos, principalmente quando sabemos que os mesmos estão a ser alvo de avaliação......o pensamento deve passar fluidamente para o papel (ou para o blog!!!), só assim será uma consideração legítima. Só posso falar em relação a mim, e como tal, essa pressão invisível aliada à falta de recursos informáticos levou-me a não fazer muitas publicações... Por vezes não as fazia com medo que alguma expressão, alguma interpretação minha que fugisse um pouco da rota "pretendida" fosse de alguma forma pejorativa...ou distorcida.... um dos problemas da "conversão de pensamentos" é esse mesmo, transmitirmos uma ideia distorcida em relação a alguma coisa.

Hegirascope

Esta obra apresenta-nos diversos textos em que cada um tem quatro ligações possíveis. Podemos optar por escolher uma ou então, ao fim de algum tempo, o texto muda por si. Ou seja, o texto tem um percurso programado mas se quisermos podemos agir sobre ele. Como o texto não está completamente determinado, a leitura torna-se mais difícil.

My Body, Shelley Jackson

É muito interessante esta obra corporal. Em "MyBody", Shelley Jackson faz corresponder a várias partes do corpo um episódio da sua vida.
Esta obra é complexa pelo facto de que há uma série de hiperligações que se ligam entre si e que fazem parecer uma teia, um labirinto...
O nosso corpo é uma "coisa" bastante complexa... penso que nunca estamos satisfeitos com ele, porque há sempre qualquer coisa que gostariamos de mudar. Tal como nesta obra, cada um de nós pode ter uma cicatriz ou até uma tatuagem que têm uma história, um significado...
"Se eu não gostar de mim, quem gostará?"

quarta-feira, maio 24, 2006

diário do professor (versão não-autorizada)

«Talvez tenha valido a pena o esforço», pensou. Começara por falar em quebrar o gelo, mas eram tantas (e tão complicadas) as coisas que publicava, que o gelo parecia aumentar em vez de diminuir. Tentara explicar que «pensar escrevendo» era uma das melhores formas de aprender e de se crescer intelectualmente. Que o exercício regular dos músculos da escrita permitia conhecer melhor o mundo e a linguagem. Permitia alimentar a curiosidade. Permitia pensar melhor. Mas como transmitir isso? E um blogue não será demasiado público para se poder escrever sem medo? Durante semanas esperou que o envolvimento fosse crescendo e se reflectisse no ritmo de publicação. Coibiu-se até de escrever, para não intimidar mais do que aquilo que um professor sempre intimida só por representar o papel que lhe cabe. Além disso, tornar possível escrever colectivamente era uma das particularidades dos media digitais, o que estava inteiramente de acordo com a reflexão que se propunha fazer. Algumas semanas foram decepcionantes. Claro que ele era por natureza reservado em relação a isso. Gradualmente, no entanto, a escrita foi ganhado momentum. «17 textos numa semana deve significar alguma coisa», pensou. Talvez fosse da primavera. Assinalou o dia com duas fotos. Dezasseis anos depois de começar, continuava a tentar responder à pergunta «o que é uma aula?» Tudo acabava sempre cedo demais. Mal parecia que tinha começado. Em que parte do corpo se guardaria esta memória?

vista de frente 2

vista de frente 1


Radiografia

Hiperficção? Sem dúvida. O texto "My Body" aparece-nos como uma radiografia da cabeça aos pés, mas podemos explorá-lo não por esta ordem, vagueando pelo mutável corpo de uma adolescente.
Assim, passamos do braço para o joelho, percorrendo todo o corpo, limitando todos os caminhos que nos são dados.
Deste modo, são os próprios leitores que organizam a sua leitura e a maneira de explorar este hipertexto.
Com efeito, vejo este corpo como uma árvore, ou uma rede e até mesmo um labirinto que pode acabar numa mão,numa perna...

Ondas...

Muito simplesmente comparemos as multi propostas de leitura possíveis do texto My Body de Shelley Jackson com um lago...
Imagine o leitor atirar uma pedra para um lago que até aí se mantinha calmo e em plena serenidade... No entanto toda a sua potencial energia cinética estava lá à espera de um catalisador que a despoletasse...
Assim é o texto analisado... Como um lago, sereno, estável até que o leitor atira a sua pedra (escolhe uma parte do corpo) e a partir daí a propagação das ondas (acesso a outras partes do corpo através de ligações hipertextuais) faz com que a plenitude potencial do lago(leia-se texto) se active e percorra todas as células e caminhos possíveis.
Assim podemos considerar que é uma leitura por ondas de choque, concretizadas em hiperligações, que nos permitem, partindo de um epicentro, navegar por todo o texto.

Labirintos? Ou diferentes Caminhos?

Tem-se aqui falado, em relação ao website de Arnaldo Antunes, de uma situação labiríntica que o referido website representa. Podemos, provavelmente, afirmar que "My Body" de Shelley Jackson de certa maneira é também um labirinto de memórias da autora.
Contudo... estaremos perante labirintos? Serão estes labirintos labirintos verdadeiramente? Não serão apenas diferentes caminhos que nós poderemos escolher?
Uma pequena reflexão poderia levar-nos à conclusão de que todo o hipertexto é um labirirnto... Ideia provavelmente errada. Todo o hipertexto será, na minha opinião, não um labirinto mas sim uma diferente escolha de caminhos...

(M)eine wunder(bare) Kammer

Tentemos aqui uma análise ao texto de Shelley Jackson. Ao entrarmos neste “mundo” somos encarados com um sem número de caminhos, os quais podem ser escolhidos contingentemente mas ao mesmo tempo com uma pré-determinação imbuída (não esquecendo que essa pré-determinação é apenas ao nível do algoritmo e das combinações já pré-estabelecidas que permitem erguer toda a estrutura do hipertexto). É essa uma das características do hipertexto: “non-sequential writing”.

Ora, não havendo sequência de leitura, como é que o leitor deverá ler uma obra destas? Decerto que não será da mesma forma como um leitor relaxado no seu sofá lê o último livro que faz furor em todas as imprensas. O que é desigual? Num livro impresso, a leitura apresenta-nos o contorno tradicional de começar na primeira página e acabar na última, isto é, não há uma caminho a fazer pelo leitor ao nível da escolha, não há multiplicação de hierarquias, não há associação. Por outro lado, no hipertexto temos todas essas características, e mais: dois leitores ao lerem uma obra dessas nunca conseguirão efectuar o mesmo circuito tal como se o fizessem num livro impresso.

Tudo isso é devido à hiperligação que permite ao leitor entrar no labirinto do texto e escolher (um processo deveras mais estimulante) o seu próprio caminho que não está determinado; o leitor entra no mundo do texto desmembrado e tenta agregar todos os membros que estão soltos, cabendo-lhe essa tarefa de unificar para que a compreensão seja atingida num processo de auto-descoberta.

A hiperligação não é só usada neste âmbito, ela está presente no nosso dia-a-dia, basta prestar atenção a uma conversa entre indivíduos e vermos o disparo da conversa para outras direcções que não aquelas tomadas inicialmente (o que, aliás, era um bom exercício de fazer: manter uma conversa unicamente sobre o mesmo tema sem qualquer tipo de desvios…) Neste texto, talvez esteja impregnada essa mesma característica, a hiperligação ao nível da vivência/consciência, visto que os retalhos do texto são episódios da autora.

E fazendo agora aqui uma hiperligação: será que um texto como este pode ser construído em livro impresso? Com um pouco de esforço e com as hiperligações anotadas nas páginas será então possível. E o oposto? Ou seja, um livro impresso com uma narrativa sequencial remediado para uma obra de carácter hiperficcional?

terça-feira, maio 23, 2006

The body, my story

Esta obra fascinante de Shelley Jackson leva-nos numa viagem de descobrimento pelo corpo da autora.
Percorremos o seu corpo como um mapa cujo destino não sabemos. Não é por acaso que cada parte do seu corpo é como que uma prateleira, uma gaveta de um armário inteiro que é todo o seu corpo. Eine WunderKammer, uma câmara de maravilhas que vamos descobrindo a cada membro, a cada parte do corpo pelo qual seguimos como que por um labirinto do qual não sabemos a saída ou mesmo se a terá.
A maneira como a própria obra está composta permite uma visão diferente do corpo humano. Cada membro, a pele, os olhos... não são apenas partes de um todo, são em si um todo com recordações e histórias. Nas várias partes despidas do corpo de Jackson vemos tedo aquilo que é mais privado que o seu próprio corpo: a sua vida.

My body

A autora utiliza as várias partes do corpo para descrever as diferentes coisas que lhe vão acontecendo ao longo da sua vida

segunda-feira, maio 22, 2006

Retalhou o seu corpo e aproximou-nos da sua alma

Antony Gormley

I was born with a short tail, which my parents decided not to have removed when I was a baby, since I seemed to take so much pleasure in it, curling it around my own wrist, whipping it on my buttocks when I was itchy or testy, and dragging small objects into my crib with it. When I was old enough to realize none of the other kids had a tail, though, I became furiously ashamed of it. I said nothing to my parents, who had gotten quite used to it, but when I went to school I pulled it forward and squeezed it between my thighs to stop its waggish commentary. At home I subjected it to horrors: sat on it, hung weights from it, clamped clothespins on it.

Em My Body, Shelly Jackson retalha o seu corpo para, paradoxalmente, nessa divisão nos aproximar das profundezas das suas memórias.
Neste processo faz-nos descobrir que as diferentes ligações do nosso corpo às nossas recordações podem funcionar como um hipertexto. Isto porque as nossas memórias não estão em nós de forma linear, elas podem surgir, claro está, de forma hierárquica, mas também por associação, por hiperligação.
S.J. mostra-nos a partir de uma imagem trivial (que poderia servir um professor de inglês) que somos mais do que a soma das partes. Nós não somos um conjunto de órgãos, cada parte do nosso corpo possui como que um pequeno cérebro que nos liga às nossas vivências, analogias, recordações, imagens, significados e sonhos.
A autora leva-nos numa vertigem que nos faz redescobrir a infância no nosso corpo, tal como actuava o sabor da madeleine de Proust.
Cioran diz que quando um órgão tiver consciência de si próprio deixará de trabalhar. O órgão não é uma unidade autónoma, a consciência de si aliená-lo-ia da sua função de trabalhar para um bem comum. O joelho, por exemplo, só existe quando sentido e idealizado pelo espírito, isto é, desde a sua forma, mobilidade, rigidez ou vulnerabilidade.

My Body

Esta obra é quase que uma autobiografia de Shelley Jackson. É como que a sua história contada a partir do seu corpo. Ela fala da relação que tem com o seu próprio corpo de mulher; fala dessa relação de uma maneira evolutiva, ou seja, da ligação que foi produzindo com o seu corpo durante o seu desenvolvimento e crescimento, desde criança até hoje. A autora transmite-nos a imagem que tem de si mesma, fisicamente, mas também psicologicamente, através da descrição, detalhada, minuciosa e separada, de cada parte do seu corpo, relatando-nos a sua experiência e os seus sentimentos para com cada pedaço de si.
Este website tem, na página principal, o desenho de todo um corpo e carregando em cada parte desse corpo temos acesso a outra página, em que a autora nos descreve esse pedaço de si. Desta maneira podemos sempre voltar ao início e recomeçar a ler de outra parte da obra - é, mais uma vez, dada ao leitor a possibilidade de decidir e escolher como quer ler a obra que lhe é dada a conhecer.

domingo, maio 21, 2006

O Corpo de Shelley Jackson

Em My Body, Shelley Jackson deixa-nos percorrer e partilha connosco a história que cada parte do seu corpo tem para contar. Trata-se de uma obra em jeito de reflexão sobre o seu corpo de mulher, em que revela as memórias do seu relacionamento com ele ao longo dos tempos, desde que era criança.
Escolhendo uma parte do corpo, é-nos contada a sua história, o seu desenvolvimento, através de analogias e referências à sua materialidade. Neste ponto, a autora relaciona-o com outra qualquer parte e daí vamos explorando o seu corpo, seja qual for o caminho, e vamos conhecendo muito mais do que a sua condição física.
É uma propriedade do hipertexto, a leitura multi-sequencial, que neste caso é brilhantemente aplicada. Não há uma hierarquia que distinga as partes do corpo, uma linearidade, como não a haverá para as recordações da autora.
Por isso, o hipertexto não retira unidade a esta obra, acrescenta-lhe, antes, características que outro meio não conseguiria potenciar.
Shelley Jackson descobriu, assim, o melhor meio para dar a conhecer a sua autobiografia mais íntima, para expor as suas descobertas, os seus desconfortos e as suas memórias.

sexta-feira, maio 19, 2006

My Body de Shelley Jackson

My body is an open book...

"I teach my lovers to read them but they are otherwise entirely private." ("tattoos")

My body is an open book...
But only who understands me can read it...

Labirinticamente organizado

O "Labirinto" de Arnaldo Antunes conduz-nos ao que realmente é o espaço cibernético: os caminhos delineados pelas hiperligações, a sua hierarquia, e a organização das páginas consteladas personificada pelo sítio web.
Na verdade, este exemplo resume o que se tem estudado, o hipertexto e todas as implicações associadas, a multimediação de várias áreas resultando muitas vezes em hiperficção.
Deste modo, os múltiplos percursos que o meio digital nos proporciona, espelham, sem dúvida, uma hierarquia maximizada neste ciberespaço onde a organização existe no caminho percorrido, ao sabor do sentido, dos vários leitores.

Encontrar um caminho no Labirinto...

O website de Arnaldo Antunes é construído em forma de labirinto, em que cada saída é um link para uma outra página do site. Esta alusão do autor a um labirinto sugere exactamente o labirinto que é a internet, com todos os seus diferentes caminhos, ou seja, todo o seu "infinito" conjunto de websites. Labirinto porquê? Porque cada vez que "mergulhamos" num site, esse mesmo site logo nos transporta a outro, e a outro, e a outro, num sem fim de conhecimentos, de novidades, de informação. São tantos os lugares a que a internet nos transporta que, por vezes, nos afastamos do nosso principal objectivo em ter acedido à internet naquele momento.
Ainda no site de Arnaldo Antunes, é transmitida também a ideia labiríntica de uma obra digital - numa obra desta natureza são-nos apresentados, normalmente, um conjunto de mecanismos que ao interargirmos com eles nos "transportam" para outras realidades web e assim sucessivamente vamos mergulhando mais fundo e dando voltas e voltas neste universo gigante!

Todos os caminhos têm saída

Ainda que, à primeira vista, a opção gráfica do website de Arnaldo Antunes possa parecer aleatória - agradável à vista, mas aleatória -, há uma relação profunda entre o seu grafismo e o modo de funcionamento de um ficheiro electrónico.
Logo na página de entrada, as opções de acesso às sub-páginas fazem lembrar um gráfico de frequências, que se vai alterando.
A primeira opção é discos, que estão organizados num esquema que sugere um labirinto. A imagem do labirinto remete-nos para a organização de uma estrutura electrónica, como o é um website. Este website, por exemplo.
O labirinto electrónico tem ainda outra particularidade: todos os caminhos têm saída. Também no website deste cantor todos os caminhos têm saída. Isto acontece porque podemos facilmente mudar para um qualquer nível (entenda-se página) sem ter de voltar à primeira página, a ligação é directa. Trata-se da propriedade de associação.
Nas outras páginas o grafismo sugere o mesmo, o labirinto, o poder de se ligarem umas às outras escolhendo qualquer caminho.

Site de Arnaldo Antunes, exemplo de uma navegação fácil

A internet é um instrumento que temos ao nosso dispor e que permite pesquisar todo o tipo de temas. A informação ao nosso dispor é acessível através do uso de um pequeno instrumento, o PC (Personal Computer). A pesquisa na internet pode ser um verdadeiro labirinto. Não é como ler um livro, que está organizado de forma mais acessível com um título, índice, capítulos e bibliografia, e mantém a mesma estrutura. Ler um livro, como por exemplo um romance, é feito de uma forma linear. A possibilidade de seguir um caminho, num site, e regressar para o ponto de partida pode tornar-se muito complicado. Os ficheiros estão distribuídos de uma forma organizada, temos três tipo de formato como o formato de labirinto, rede (reticular), ou de árvore (arborescente).
O site de Arnaldo Antunes é um excelente exemplo de como podemos seguir vários caminhos, como num labirinto, e no entanto regressar a qualquer momento para o menu inicial. Isto é possível porque o site mantém sempre presente a estrutura inicial.

"Log" de Jim Andrews

Log utiliza o vocabulário e estrutura dos e-mails e combina-os com a mutação constante do texto quando o utilizador passa o ponteiro do rato sobre o texto, texto esse formado por frases simples e dando no texto original a ideia de um diálogo com o registo da hora das respostas. Com a interacção do leitor o texto modifica-se tornando-se cada vez mais compacto. No texto o autor refere-se várias vezes a si próprio e utiliza também muitos verbos, o texto divide-se em várias tonalidades podendo isto significar textos distintos combinados num só, embora aparentemente sem grande sentido.

Story of my body

Shelley Jackson faz um trabalho deveras interessante. Ela conta a história do seu corpo, cada parte com algo diferente para contar. Ela faz desenhos de si mesma e é clicando ou no braço ou em qualquer outra parte do desenho que nos leva para a sua história. A forma como ela descobre o seu corpo e as consequências do que ela faz com ele na sociedade reflecte-se na sua arte e nas descrições cruas de si mesma. Shelley é, certamente, uma pessoa cujo corpo dá vontade de conhecer.

"Strings" de Dan Weber

O poema é composto por 8 conjuntos que parecem contar uma história que vai evoluindo positivamente, uma vez que começa com uma discussão em que apenas aparecem as palavras yes e no e que acaba com uma frase. Este poema sugere uma conversa entre duas pessoas que, ao início, não concordam uma com a outra, mas que, seguidamente, já aparece uma possibilidade (maybe). Em Flirt, as palavras aparecem ligadas. Em Flirt (cntd) dá a entender que estas duas pessoas se entendem finalmente. Haha sugere que a felicidade, a alegria paira sobre eles. Youandme sugere a ligação entre as pessoas, que já existe uma relação definitiva. Arms é o abraço entre as duas pessoas, a sua união. Na última parte, a frase dá a entender que uma das pessoas está a declarar os seus sentimentos pela outra.

quarta-feira, maio 17, 2006

Strings de Dan Waber

A nossa vida é uma pequena corda de uma guitarra que, ao ser tocada, ora diz Yes, ora diz No, ora diz Maybe, ora se ri ao sabor das ondas do mar...

O que acontece em desembaraçando as ondas em Goonhilly

Deformam-se as palavras, constroem-se novas palavras. Exploram-se as suas possibilidades.
Atinge-se a liberdade quando dominamos as palavras, quando criamos as nossas próprias palavras. Daqui resulta o anticonformismo e aqui nasce:
uma sardinha com cara de golfinho;
um cão oval;
um telfinho (golfinho que diz);
um cãofinho (cão fofinho);
No Arquipélago dos Açores tive a oportunidade de conhecer o peixe-galo e o peixe-porco, Edwin Morgan trouxe-me o peixe-cão.
Nem todos os casamentos são felizes, mas certamente que alguns o são.

domingo, maio 14, 2006

Liberdade de Interpretação

"A liberdade de interpretação é inerente ao acto de leitura." O simples facto de sermos leitores implica, desde logo, uma interpretação daquilo que estamos a ler. Conscientemente ou inconscientemente, quando lemos um livro ou vemos uma obra de literatura digital, estamos a dar a nossa própria interpretação ao que lemos. A interpretação é por excelência um acto singular - o mesmo objecto de interpretação é imaginado de forma diferente por cada um de nós. Mas podemos nós considerar que a liberdade de interpretação é maior ou menor consoante o formato em que a obra nos é apresentada? Eu penso que sim. Quando lemos um livro, temos o papel, as palavras, as frases e toda uma imaginação que provém das ideias transmitidas por aquelas letras... Mas se estivermos a ler algo em formato digital, na minha opinião, essa imaginação é alargada e a nossa liberdade de interpretação é maior. Numa obra de literatura digital, além do texto em si, podemos ver ainda os mecanismos que o envolvem - quer sejam imagens, sons, movimentos, hiperligações, etc. E neste caso interpretamos não só o texto, como tudo o que o envolve. Aqui o autor transmite ideias e aguça a nossa imaginação não só através do texto, mas também através de operações interactivas programadas por meio do computador. A obra digital joga não só com a visão, através da leitura ( como no livro), mas também com outros sentidos, como a audição. É nesta perspectiva que considero a liberdade de interpretação mais expansiva nas obras em formato digital.

sexta-feira, maio 12, 2006

Strings by Dan Waber

Foi através do programa Flash que Dan Waber criou este poema e é segundo uma sequência de animações que ele se processa.
Uma corda (string, em inglês) constitui a unidade mínima do texto e vai ganhando formas em cada um dos "capítulos" que formam esta história. Extremamente minimalista, é certo, mas consegue fazer alusão ao elemento mínimo da escrita - o traço... a corda.
Na primeira animação, Argument, o traço forma as palavras yes e no, uma de cada vez e em cada um dos extremos do mesmo. É simulada uma discussão (argument). O pólo positivo e negativo, as diferenças entre dois estados - ou duas pessoas.
Segue-se Argument 2, em que para além das palavras anteriores, entra também a maybe, que dá a ideia de um ponto intermédio. Um momento de dúvida ou a chegada a um acordo? As palavras estão soltas, movem-se, empurram-se.
Em Flirt dá-se o "namoro" entre as palavras no e maybe, que se desfazem, como que derretendo.
Segue-se Flirt (continued) em que a palavra yes salta, deixando adver felicidade.
Haha são risos. Ora de um lado, ora do outro, até serem simultâneos, totais, voltando a sugerir felicidade.
Em Youandme a palavra me (eu), orbita em torno do you (tu). O que antes eram dois pólos - yes e no - são agora duas pessoas, a sua relação.
Segue-se a animação Arms, em que é simulado um abraço. Um abraço entre you e me, eu e tu, a fusão entre ambos.
No último "capítulo" desta história, Poidog, a linha forma a frase words are like strings and pull out of my mouth. Há a alusão ao osciloscópio, que representa graficamente a voz.
Mas não é só a voz que é representada neste poema. São estados de espírito, pessoas, sentimentos, relações.

quinta-feira, maio 11, 2006

Spas(m) Text by Jim Andrews

Ora, o que (nos) acontece quando estamos perante este texto digital de Jim Andrews…Nas primeiras impressões podemos ficar um pouco baralhados e até mesmo não entender o que realmente se passa ali naquele amontoado de palavras que se movem com a interacção do leitor no texto. A pergunta poderá ser gritada de imediato: “qual o sentido deste texto?” Bem, decerto que ninguém olha para um texto como este e fica no “grau zero”, dado que todos (regra geral) temos o código da escrita em nós e muitos terão sem dúvida o código da língua: o que nos vai permitir avançar para um grau não zero, ou seja, uma não total imobilidade perante tal obra; ou mesmo se quisermos dizer: há sempre qualquer coisa que fica em nós, por muito que seja difícil de interpretar, nem que seja o pensamento de que essa mesma obra foi realmente muito difícil de traduzir. Portanto, estes dois aspectos são muito importantes: o conhecimento prévio da língua e o da escrita. Tendo estes dois aspectos presentes, falta só o aspecto hermenêutico que (e)levará a luz ao nosso pensamento.

Como poderá um texto (como este) fazer sentido para o leitor? Ora, teremos que ter em conta que qualquer texto, obra, música, um pássaro a voar, só tem sentido com uma consciência por detrás. Exemplo: um sino que toca no meio do deserto sem que ninguém o ouça (tirando aqui a possibilidade que estamos a pôr quando dizemos que ele está lá a tocar). Será que esse som tem sentido ou significado? Não poderá ter porque não houve ninguém que o ouvisse para dizer que ele lá esteve. Um físico poderia dizer que esse som lá estaria independentemente de alguém o ouvir ou não, mas em termos de uma concepção temporal filosófica, qualquer som ou evento só poderá ter sentido ou mesmo existir quando uma consciência está lá. Um outro exemplo poderá ser dado para um melhor compreensão: imaginemos que toda a raça humana desaparecia! Será que o vento continuaria a soprar? Mais uma vez, um físico esfregava as mãos de contente e dizia que sim, mas ao nível da consciência não haveria mais vento porque não haveria nenhuma consciência que o sentisse; o “eu” subjectivo não estaria lá para sentir, logo para esse “eu” não haveria qualquer fenómeno.

(Fechando este parêntesis) Com essa consciência por detrás e com a apropriação do texto pelo leitor será que autor e leitor se encontram? Não. Não porque o processo de leitura e a participação do leitor é diferente do autor, não há encontro. O leitor ao ler este texto está a experimentar um sem número de re-combinações que o autor não as fez, elas são geradas automaticamente e sem qualquer controlo prévio. Neste exemplo, tudo acontece de forma automática com o tempo e com o movimento do cursor; o leitor apenas pode “parar o tempo”, mas mesmo assim não pode prever o que vai acontecer. Sendo assim, o que aconteceu neste texto que rompeu com a estrutura clássica de um texto? Com este exemplo, como podemos definir um texto?

Simplesmente o texto não está completo/acabado, dada a sua estrutura (poderíamos denominar de uma "estrutura por camadas”) que permite inúmeras re-combinações em que o leitor vai criando actualizações potenciais. Com esta “estrutura de camadas” de textos sobrepostos estamos perante uma obra semi-determinada.

quarta-feira, maio 10, 2006

"Log" de Jim Andrews

"Log" é um texto de Jim Andrews muito interessante pelo facto de podemos mexer nele e agitá-lo dando-lhe uma forma diferente.
Há uma mudança de tempo mas que é bastante lenta pelo facto de que o tempo avança de minuto a minuto. O mais curioso é que a hora (4:00) se mantém, o que muda são os minutos que correspondem a um fragmento.
Os movimentos do texto são como os movimentos que são executados com o passar do tempo.
Cada minuto corresponde a um fragmento de texto que é iniciado sempre com a primeira pessoa do singular e que é constituído por cores diferentes. Essas cores podem querer dizer que há mais do que uma pessoa a intervir.
Esta obra é interessante pelo facto de que se estivesse em suporte escrito não existiria uma noção de movimento e de passar da hora que acontece em suporte digital. Mais ainda porque em suporte impresso existe uma organização do texto e uma sequência.
Esta obra pode ser um bom exemplo para constatar os prós e os contras da poesia digital.

E.M.de Melo e Castro

"O Caminho do Leve" é uma exposição muito interessante de E.M de Melo e Castro, que está patente no Museu de Serralves e que reúne varias obras em diversos suportes deste artista.
Ao longo da exposição podemos observar por exemplo, Fractopoemas, Infopoesia, Poesia Sonora Interactiva, Poesia Concreta, Poemas Fílmicos, entre outros...
É uma exposição na qual a cor e som são os elementos fundamentais. De facto, Melo e Castro faz das palavras um jogo, e brinca com as elas de modo a dar-lhes uma noção de movimento ou uma forma como é o caso do poema "Pêndulo", bem como muitos outros.
Podemos interpretar o título da exposição de diversas formas..."O Caminho do Leve". Podemos considerá-lo como sendo uma via para a nossa felicidade, libertação...
De certa forma "O Caminho do Leve" é um escape para o stress da nossa vida...

"Log"

A obra "Log" de Jim Andrews está bastante interessante porque aparece-nos um texto inicial que é completamente alterado quando se move o cursor sobre os diferentes segmentos. Estes segmentos têm três variações. Ou seja, é possível decompor ou compor a estrutura do texto. Com isto, verifica-se uma grande oscilação que dificulta a possibilidade de atribuir um sentido ao texto devido ao movimento repentino das palavras. No texto existem duas cores (branco e cinzento). No branco é utilizada a primeira pessoa. A utilização das duas cores sugere que existem duas vozes diferentes. Até mesmo as horas se alteram mas há sempre um número que fica presente: o 4. Podemos então concluir que à medida que o tempo passa, o texto muda.

sábado, maio 06, 2006

Um texto que passa como o tempo que passa


04:51:00 - I split the full scale mark - I choked and drooled - I was memory bound - I muted analysis - I thought I'd start -

04:52:00 - I'd been aware - I'm dead I'm dead - I'm standing up - I'm what you want - I programmed it -

04:53:00 - I hit disconnect - I am not I - I caught your head - I changed my life - I was amazed -

04:54:00 - I had been feeling like a frond - I loved I died - I said I said - I went to a street - I waited -

04:55:00 - I was pressed down upon - I held it back
- I went outside - I knew what it was - I altered -

A obra «Log» de Jim Andrews, feita a partir de um texto de Brian Lennon, começa com cinco entradas de cinco frases cada, a seguir ao que parecem ser os registos digitais de cinco minutos consecutivos, entre as 4h e 51min. e as 4h e 55min. As 25 frases iniciais contêm o pronome "I". Assim que o/a leitor/a move o cursor sobre algum dos segmentos do texto inicial, estes começam a mudar muito rapidamente. As frases iniciais permanecem a branco, enquanto os novos sintagmas surgem em cinzento. Depois de passarmos repetidamente o cursor pelas várias zonas do texto, percebemos que cada segmento alterna com outros três segmentos, programados para surgirem naquele ponto. Os próprios espaços entre as cinco entradas iniciais se reconfiguram dando origem a outros blocos, até ficar só um bloco de texto, sem as horas:

vox coriolis - it does not want to know - roaming whispered - set down that anguish - reversing tone - it was the end of all - it was the light - it was all night - speeding apart - what am I then - it rose - remotely sensing - electric vex - clocks chemistry - belonging beginning on that day - lips harboring seepage - nothing began - bright chills and chokes - parsed element 01 - it was my life - it turned - lovelens - ocean and avalanche - explain and cure - small exclamations - to blink, shortshort - to stall itself - strenuous read - return - at night -

Este fotograma do texto contém 30 segmentos, ou seja, exactamente o mesmo número do primeiro conjunto, se contarmos as cinco entradas numéricas. Entretanto, com um novo clique no cabeçalho de e-mail original, na base do texto, uma nova sequência de 5 entradas e 25 sintagmas aparece, desta vez marcando os minutos entre as 4h e 24 min e as 4h e 28min. Também neste caso temos 25 + 5 fragmentos textuais:

04:24:00 - was intermittent - made contact - valued heights - done easily - milled out -

04:25:00 - loomed origin - breathed out - breathed in - had dreamed - echoed there -

04:26:00 - guessed again - drank suddenly - drank worse - standing in hallway - was late -

04:27:00 - protecting bones - made contact there - was starving there - had run - knew it was me -

04:28:00 - gave my name - had myself cut - was never there - was long ago - was ever -

Percebemos neste momento que quer os sintagmas do bloco de texto anterior (2ª sequência), quer os sintagmas destas novas cinco entradas de cinco frases cada (3ª sequência), todos em cinzento, eram os que alternavam com os 25, em branco, da primeira sequência. Qualquer movimento do cursor sobre o texto gera recombinações destes três grupos de elementos, criando a sensação de um texto que muda constantemente. Se o cursor parar, o texto pára também, e o/a leitor/a pode ler um dos resultados aleatórios dos movimentos e das paragens que fez com o cursor.

vox coriolis - it does not want to know - roaming whispered - valued heights - I muted analysis - it was the end of all -
04:25:00 - it was all night - speeding apart - I'm standing up - it rose - echoed there -
04:26:00 - clocks chemistry - drank suddenly - I caught your head - nothing began - was late -
04:27:00 - it was my life - it turned - was starving there - had run - explain and cure -
04:28:00 - to blink, shortshort - to stall itself - strenuous read - return - I altered -

Uma leitura das palavras paradas dá conta de um jogo de vozes: frases com o pronome "eu" alternam com outros sintagmas cuja semântica sugere a linguagem e a possibilidade de linguagem da máquina e do próprio processo de composição electrónico. A ligação a que o texto alude parece ser a ligação com a máquina e com a linguagem como máquina combinatória.

Stir Fry Texts

Esta obra de Jim Andrews é ainda mais complexa e mais difícil de compreender o real sentido que o autor lhe queria dar do que outras que já vimos. Isto porque nos dá uma liberdade ilimitada de interpretação, na medida em que o texto não permanece fixo, é como se o texto se encontrasse em permanente agitação. Desde logo a forma como o título se-nos apresenta - as três palavras sobrepostas - dá ao leitor uma ideia do que vai encontrar ao longo da obra.
Cada vez que arrastamos o rato sobre o texto Log, as palavras que o compõem alteram-se instantaneamente para outras. O texto aparece-nos divido em partes por uma determinada hora. Esta mutação constante do texto, das palavras, do sentido, pode ser relacionada com a constante mutação do mundo e da vida - a cada hora, a cada minuto, tudo muda. Tal como o mínimo movimento do rato sobre o texto o altera de imediato, também um pequeno momento, uma pequena situação pode mudar os sentimentos, as opiniões, as atitudes, as acções de alguém ... É aqui que nos deparamos com as horas, com os minutos, com o tempo sempre a passar e com tudo sempre a mudar. A vida é tao sensível ao mundo que a rodeia, como este texto é sensível ao movimento do rato que toca as suas palavras. Não há nada que permaneça imutável.

sexta-feira, maio 05, 2006

"Strings" uma história

Dan Waber conta-nos uma história, cujas sequências são controladas pelo leitor. Não nos apercebemos, como leitores, imediatamente que está a ser apresentado uma história. Interpretamos os signos e vamos criando o sentido no decorrer desta apresentação. A escrita é feita utilizando movimento e o mesmo sucede numa relação amorosa, não é estática. De início são imensas as dificuldades de passar para papel os nossos pensamentos e o mesmo sucede com algumas relações amorosas, pois temos duas pessoas que são diferentes e se vão conhecendo, como nos é mostrado na primeira sequência argument, no entanto existe sempre uma ligação. O processo criativo passa sempre por várias fases, tal como nas relações humanas e isso é muito bem representado nas sequências seguintes de "Strings". A comunicação existente é também reforçada através das formas onomatopaicas que nos são apresentadas na sequência intitulada ha ha.
A comunicação é possível de diversas "formas e tamanhos", arms.

quinta-feira, maio 04, 2006

Music Animation Machine





Stephen Malinowski, numa tentativa de contornar a complexidade da notação musical convencional, e após várias experiências, encontrou na animação de imagem por computador um novo meio de escrever e ler música. Assim, e à semelhança do trabalho no campo da videopoesia de Melo e Castro, a sua Music Animation Machine "transforma[m] em movimento aquilo que sobre papel é apenas sugestão estática de movimento”¹

¹ in Manuel Portela, org., Wor(l)d Poem/ Poema Mu(n)do, Figueira da Foz: Museu Dr Santos Rocha, 1993, pp. 76-78.

quarta-feira, maio 03, 2006

Strings

Esta obra digital de Dan Waber apresenta-se-nos como uma narrativa, mas de uma forma muito mais expressiva, aliando a imagem, o movimento e a palavra. A obra é uma sequência de imagens, em que cada uma pode ser comparada a um capítulo de uma história. Toda a obra, é um texto muito minimalista, composta praticamente só por duas palavras. A primeira imagem tem o título de Argument e podemos ver uma linha, um traço, que forma em cada ponta as palavras YES e No, como se fossem os pólos de uma corda, que esteja a ser puxada por duas pessoas que argumentem opiniões diferentes. Há uma clara oposição e contrariedade, ditada pelas palavras SIM e NÃO. Transmite a ideia de uma discussão. Na segunda imagem há o acrescento da palavra MAYBE, como se começasse a haver um amenizar dessa discussão, um certo consenso.
A imagem seguinte tem o titulo Flirt – podemos logo situar a obra num contexto de uma relação amorosa. A união das três palavras significa também o fim da discussão. A continuação do titulo Flirt – uma imagem muito mais animada, um movimento de felicidade e alegria. Instala-se a harmonia. O titulo seguinte, Haha, associa-se de imediato ao riso, à gargalhada. A sequência seguinte, You and Me e Arms suscitam algo de envolvente, uma união plena. E, finalmente, Poidog – as palavras fluem-lhe facilmente, há um acto de comunicação – exactamente o que é transmitido ao longo da obra, uma nova forma de expressão e de comunicação, através de apenas algumas palavras explicadas através de um traço em movimento ( a base de toda a escrita).

Pedro Barbosa, Sintext

Sintext foi elaborado em java e apresenta vários textos on-line que podem ser alterados automaticamente com base na sua estrutura gramatical, (substantivos, adjectivos, verbos, etc...), permitindo assim a criação de novos textos com uma estrutura correcta mas com sentido variável. Estes textos produzidos automaticamente pelo programa são sempre originais, permitindo explorar todo o seu potencial e obtendo resultados por vezes bem conseguidos mas também resultados algo cómicos ou sem sentido. Esta ferramenta permite-nos avaliar de forma prática a escrita automática que tem vindo a desenvolver-se com resultados bem conseguidos nos últimos tempos.

terça-feira, maio 02, 2006

Raymond Queneau, "Exercices de style"

Em "Exercices de style" Raymond Queneau descreve-nos um acontecimento absolutamente banal de 99 maneiras diferentes.

À primeira vista o que poderia parecer uma tarefa absolutamente impossível (como seria possível haver tantas maneiras de contar uma cena tão quotidiana?) é de facto um verdadeiro exercício da mente, da escrita e da imaginação.

Levando a escrita e as suas convenções a um nível ainda mais alargado, Queneau presenteia-nos com versões deliciosas do encontro entre dois estranhos num autocarro.

Se “quem conta um conto acrescenta-lhe um ponto” também é verdade que quem lhe retira um ponto pode por vezes acrescentar pormenores que de outra forma não teríamos prestado atenção. Cada versão acrescenta dados novos à descrição do acontecimento e embora algumas versões sejam mais minimalistas a ideia de potencialidade está sempre presente. Basta a leitura de algumas das 99 versões para nos apercebermos que a maneira como normalmente descrevemos as coisas é apenas uma das inúmeras possibilidades. Explorando as convenções da escrita, que já é em si uma convenção, podemos mostrar vários mundos dentro do mesmo mundo, 99 encontros dentro do mesmo encontro.

A fuga às regras da escrita, que à partida espartilham o que contamos, será então a mais criativa de todas as regras.

leve, muito muito leve

E. M. de Melo e Castro. Poeta e artista visual que anda à 50 anos (pelo menos) a experimentar.
A sua obra coloca-nos em ligação directa com a poesia. Com os seus poemas visuais como o “pêndulo” ou “tanto bate até que fura” sinto-me leve, muito muito leve. Aqui o visual encarna o sentido.
Nas suas experimentações com o vídeo, Melo e Castro mostra-nos imagens que se metamorfoseiam e que provocam algo que roça o estado hipnótico. As imagens brincam com a minha mente, e esta deixa-se levar.
Em relação à exposição de Serralves, de uma maneira geral, senti que algumas obras se perderam devido ao excesso de informação, que nos impedia de agarrar a profundidade de cada imagem.

segunda-feira, maio 01, 2006

Criação Digital (Enunciado do Trabalho Final)

NOTA: Este trabalho representa 50% da classificação final da disciplina e é obrigatório para todos/as os/as alunos/as. No caso de alunas/os em avaliação contínua, os restantes 50% resultarão dos textos produzidos para o blogue da disciplina. No caso de alunas/as em avaliação final, os restantes 50% resultarão do exame final. Nos termos do regulamento de avaliação da Faculdade, haverá uma apresentação/discussão oral do trabalho em data a combinar com o docente. Data limite de entrega: 2 de Junho de 2006.

Ao longo do semestre temos procurado conhecer, interpretar e analisar várias obras inter-media, produzidas quer em suportes tradicionais, quer com recurso ao computador. Vimos designadamente vários tipos de textos combinatórios, sonoros, visuais e cinéticos. Procurámos ainda descrever as propriedades específicas do meio tipográfico e do meio digital. Vimos também argumentos relacionados com questões como meio e mensagem, escrita e leitura, hipertexto e hipermédia, interactividade e participação do/a leitor/a, motores textuais e criação assistida por máquinas, etc. O trabalho que proponho a seguir pretende verificar pelo menos uma destas duas competências: a) capacidade de analisar criticamente, com recurso à bibliografia recomendada, uma obra ou um conjunto de obras literárias digitais; b) capacidade de conceber e/ou realizar uma obra de natureza digital, que deve ser descrita e explicada detalhadamente.

Escolha apenas um dos dois projectos indicados a seguir como trabalho final:

PROJECTO A.
Descreva e analise uma ou várias obras de natureza inter-media e/ou digital. Esta análise deve revelar conhecimento dos problemas teóricos tratados nas aulas e deve estar informada pelas leituras recomendadas. Serão especialmente valorizadas a capacidade de relacionamento e problematização das questões. Extensão do texto: cerca de 3000 palavras.

PROJECTO B.

Consiste na criação de uma obra digital ou de um projecto para uma obra digital, recorrendo a programas de computador (processadores de texto e de imagem, programas de criação de páginas web, etc., como Word, Powerpoint, Flash, FrontPage, Dreamweaver, etc.), materiais encontrados em linha, máquina fotográfica digital, telemóvel, etc. A obra digital (criada ou apenas projectada) deve ser objecto de uma descrição detalhada [1].

[1] Sugiro duas possibilidades relativamente simples: a) criar um texto visual combinando palavras e imagens pesquisadas em linha, estabelecendo entre elas alguma espécie de nexo hipertextual (relativamente fácil de fazer usando, por exemplo, a aplicação Powerpoint); b) escrever um conto combinatório, com linhas de acção alternativas, criando hiperligações entre os vários fragmentos (relativamente fácil de fazer usando, por exemplo, a aplicação Word), eventualmente recorrendo também a elementos gráficos. Estou disponível para responder a quaisquer dúvidas ou necessidades de orientação.

SINTEXT - Pedro Barbosa

A obra Sintext de Pedro Barbosa reúne vários textos em formato digital e interactivo e fáceis de lêr. Os textos vão aparecendo aos poucos, palavra por palavra, e vão-se formando frases que constituem o texto em si. Quando lemos um destes textos é como se o estivéssemos a escrever ao mesmo tempo, dada a forma como nos é apresentado. Porque não é como um livro, em que temos presente o texto todo logo de início; aqui ele vai-se compondo aos poucos, como se estivesse a ser escrito naquele momento. Tendo ainda a particularidade de escolhermos a velocidade a que o texto nos aparece. Há uma clara separação entre o autor e o seu texto.
Pedro Barbosa criou ainda alguns textos muito originais. Escreveu uma frase e ultiliza as palavras que a constituem para criar uma sequência de frases, sempre com as mesmas palavras, mas sempre numa ordem diferente. Muitas vezes, as frases não têm qualquer sentido, mas tornam-se bastante cómicas.

quarta-feira, abril 26, 2006

Universalidade e continuidade em E. Melo e Castro

A exposição de Melo e Castro, no museu Serralves, é inovadora no sentido em que reúne a poesia e os novos meios tecnológicos garantindo a sobrevivência da poesia em papel. À entrada é-nos apresentada uma construção arquitectónica de três espaços, um espaço fechado e central, e dois espaços pequenos adjacentes no qual o visitante pode entrar. No espaço principal é projectada uma série de imagens em televisores estrategicamente colocados. A mensagem que nos é transmitida é a falha na comunicação na nossa sociedade. É irónico que vivemos na era de uma grande divulgação de informação, e na era da Revolução Tecnológica, no entanto não somos capazes de "comunicar" uns com os outros. Será que se "comunicava" mais quando não tínhamos estes meios à nossa disposição? No interior de dois espaços adjacentes ao bloco central somos confrontados com imagens e sons, aos quais automaticamente reagem os nossos sentidos auditivo e visual. A sensação é atrofiante, assustadora e confusa, a vontade de sair daquele espaço escuro e procurar algo que faça algum sentido ou alguma lógica.
Na segunda parte da exposição encontramos trabalhos anteriores de Melo e Castro, os seus poemas ou melhor dizendo viso-poemas, como por exemplo "o pêndulo", e info-poemas. E ainda numa terceira divisão são-nos apresentadas explicações, por parte do artista, de algum modo filosóficas sobre as suas obras. E. Melo e Castro faz uso de vídeo e retroprojectores criando aqui uma inter-relação entre vários média, transmitindo a ideia de continuidade e universalidade da arte.

uma vez mais melo e castro...

Pêndulo de EM de Melo e Castro

Não mais recuo: o que escrevo é escassez e fendas,
é contra esse modo reto e seguro de escrever que escrevo — em desaprumo.
Bebo o gosto travado desse poema numa cobiça de ser dito:
um laivo de sangue escorre de minha boca.
O processo vital subsiste ainda na artéria, a manhã poluída prossegue sua lenta engrenagem,
seu incêndio diário,
sua assimetria — apesar do azinhavre
no garfo
do pêndulo,
do cotidiano cigarro
igual ao trabalho noturno da morte num corpo.
Mas pra nomear o que respira secretamente por trás dessa vida de veias
nervos assombros penhoras e sofre desfiladeiros poços terrenos baldios,
a mais inexplicável vertigem — nenhuma palavra é possível: nenhum selo.

Agreste de Luís Inácio Araújo

E. M. de Melo e Castro, Retratos Metamíticos

Mensagem clara

O poema de Edwin Morgan é bastante interessante tanto a nível visual como de significado. As letras de 'Message Clear' caem como se fossem peças de legos ou até um jogo de Tetris, e que no fim formam uma frase. Por outro lado, estas letras formam outras palavras com significado até atingir a frase final. Para além disto ainda tem o significado bíblico, já que o 'I' refere-se a Jesus Cristo, e não ao autor.

Levemente Inseridos

Fomos de viagem ao Porto e de repente, Levemente, foi-nos apresentado um novo caminho...

A exposição com que Melo e Castro nos presenteia é tudo menos estaticismo, imobilismo. Um universo de sensações adormecidas por dias de tédio e rotina, ganha consciência e passa a controlar-nos com uma influência mental considerável. A cor, o som, a luz, e a ausência delas, transportam-nos para uma dimensão estético-sensorial pré-concebida que pela sua interactividade, morrerá sem a colaboração do leitor/espectador/ouvinte ( nós!!!) por falta de vida.

De poemas fixos a salas interactivas que dependem da nossa colaboração passando por maravilhos e fixados Infopoemas, Melo e Castro providencia-nos com as ferramentas necessárias para a construção de um novo Universo... No entanto, sejamos Deuses ou semi-Deuses, é o bater do nosso coração que o anima, lhe dá vida. É nas nossas veias que corre o sangue da inerpretação poética... Mais do que nunca, o trabalho de criação/interpretação poética, confunde-se e complementa-se. Autor e actor são mais do que nunca cúmplices neste suave crime da génese literária.

Uma sala vazia

Uma sala vazia que se enche de gente que não comunica entre si. Uma sala vazia e fechada que não comunica com o exterior. Este conceito de "não-comunicação"é explorado por Ernesto de Melo e Castro na performance "Incomunicação à Distância". Várias pessoas instruídas para não interagir umas com as outras foram fechadas numa sala completamente vazia e sem janelas. Foi-lhes dito para atender os telemóveis à medida que estes fossem tocando mas… de cada vez que um telemóvel tocava do outro lado ninguém falava.

À primeira vista nada disto faz muito sentido, mas se pensarmos bem quantas destas salas não encontramos todos os dias à nossa volta nos mais variados sítios. Na era da comunicação não estaremos todos afinal numa imensa sala cheia de pessoas que não comunicam entre si mas que vivem na ânsia de comunicar com o exterior?

terça-feira, abril 25, 2006

Serralves - Exposição de Ernesto de Melo e Castro

Ao longo da exposição de Ernesto de Melo e Castro, "O Caminho do Leve", pudemos ver como ele une, de forma original, a palavra à imagem visual e auditiva. Logo na primeira obra que vimos ele transporta a sua poesia até às novas tecnologias, usando nela vários tipo de media. A obra consiste em 3 ecrãs, com a imagem esverdeada, nos quais vemos pessoas a andar de um lado para o outro, fechadas dentro de uma pequena sala e sem qualquer tipo de comunicação entre elas - nem sequer contacto visual. Ao mesmo tempo os únicos sons que se ouvem são telemóveis constantemente a tocar e pessoas a atender e a perguntarem insistentemente quem é, sem que obtenham qualquer tipo de resposta. Para mim esta obra pode ser uma alegoria da nossa sociedade. Um espaço exíguo, em que as pessoas não falam, não comunicam e andam apressadamente é comparável às ruas das grandes cidades em que todos se cruzam mas, de certa forma, ninguém comunica porque ninguém se conhece; o ensurdecedor som dos telemóveis , comparável a infinidade de barulhos que ouvimos quando vamos pela rua - carros, buzinas...
Também apreciei, especialmente, a outra parte da exposição em que o autor alia a poesia ao desenho - a palavra é escrita de forma a representar aquilo que ela própria designa.

sexta-feira, abril 21, 2006

Sinfonia do arco-íris

Claire de Lune tem na representação de Stephen Malinovsky uma visão gráfica semelhante aos compositores de musica existentes para computador o que nos dá uma outra visão das pautas a que estamos habituados tornando-se assim mais simples a sua interpretação e com um grafismo mais agradável. Claire de Lune toma assim uma forma muito interessante nesta combinação sonora e gráfica.

Concretizações

A conferência de Jorge Luiz António alerta-nos para uma questão que nunca deve ser desconsiderada.
Tão importante como a criação artistica, neste caso poética, é o seu estudo.
E se no estudo interpretativo essa mesma importância é facilmente observável, mesmo naquele que individualmente e de uma forma até um pouco casual é feito por cada leitor, é supremamente importante o estudo académico da obra poética. E porquê?
É no estudo académico que a vertente do trabalho e da continuidade criativa de uma corrente poética mais é apreciada e demonstrada. Permite a comparação e o contraste entre um autor ou entre vários autores, a sua localização temporal, as influências que diversas obras sofrem ou provocam.
Assim, o trabalho imenso de Jorge Luiz António sobre Poesia Digital (eu escolhi este termo dos muitos sugeridos) deve ser valorizado como obra essencial para a compreensão das diversas obras poéticas analisadas. Mais, a própria "catalogação" de obras poéticas é também em si um estudo interpretativo pois coloca-as em patamares comparativos entre elas.
Finalmente, o caracter contemporâneo deste trabalho merece destaque pois estamos perante factos que aconteceram recentemente ou estão mesmo a acontecer.Leva-nos quase a sentir que fazemos parte do que está a acontecer...

quinta-feira, abril 20, 2006

Ser mais artificial do que homem não há ou Quando aquilo que importa é o movimento de fusão que faço com as palavras

Saber se a máquina poderá gerar poesia...
Saber se poderá ser considerada como boa poesia...
Saber se será o início do fim da poesia feita pelo homem... Se somos assolados pelo medo da ideia maniqueísta de artificial / natural, respondo: ser mais artificial do que o homem não há. Artificial quando é autómato, quando aceita sem reflectir, sinto-o como algo que me constrange. Mas artificial por que se constrói, porque elimina velhos preconceitos, porque mata as partes necessárias para se melhorar, então aí, sinto-o como um dádiva.
...
Neste campo de batalha há-de existir sempre um lugar para o homem, pois este estará sempre em vantagem em relação à máquina: ela não tem particularidades, estados de alma, ansiedades, imaginação, consciência da sua mortalidade, erotismo...
Mas aqui, neste espaço, o que realmente me importa, é que com a poesia concreta e depois com a poesia digital, a minha consciência sobre o poder das palavras agudizou-se. ”A palavra lançada na mente, ao acaso, produz ondas de superfície e de profundidade, provoca uma cadeia infinita de reacções, transportando na sua queda sons e imagens, analogias e recordações, significados e sonhos num movimento que interessa a experiência e a memória, a fantasia e o inconsciente. ”Gianni Rodari in Grammatica della Fantasia
Uma palavra isolada pode funcionar como uma palavra mágica, mas na realidade não basta um polo eléctrico para fazer faísca, são precisos dois.
A palavra isolada contem nela expressão, mas quando encontra outra que a provoca, que a obriga a sair dos caminhos do hábito, a percorrer outras artérias, aí sim, começa a luta

quarta-feira, abril 19, 2006

O caminho do leve

Ao contrário da maioria das exposições que encontramos nos museus (quadros com pinturas, esculturas e alguns objectos), E.M. de Melo e Castro traz-nos um diferente modo de exposição. Ou seja, a exposição deste poeta é feita através de alguns filmes, imagens e quadros com a sua poesia. Ele mostra-nos como é possível relacionar a palavra com a imagem, utilizando diversos meios (multiplicidade). É interessante como o autor consegue, no próprio local da exposição, gravar uma cena em que as pessoas não cruzam olhares nem comunicam entre si; apenas se ouve o toque de telemóveis e a voz das pessoas a atender. O autor apresenta-nos videopoemas, poesia concreta, infopoesia, poesia sonora interactiva e poemas cinéticos e filmicos. A certa altura pude ler uma frase de E.M. de Melo e Castro que dizia: "desenhar, escrever e pintar é tudo a mesma coisa".

terça-feira, abril 18, 2006

Piano de cores


Claire de Lune de Claude Debussy é uma música lindíssima tocada ao piano e que nos transmite uma grande calma e tranquilidade.
Stephen Malinovsky transpô-la para um suporte visual, no qual as notas da música correspodem a uma cor, como se tratasse de uma pauta musical.
O próprio fundo do suporte em negro sugere-nos uma noite escura com a lua a ilumina-la.
É simplesmente linda...

sábado, abril 15, 2006

E.M. de Melo e Castro, O Caminho do Leve (2006)


Na visita à exposição retrospectiva de Melo e Castro devem ser objecto de observação atenta pelo menos os seguintes aspectos: 1º) a relação entre a obra e o meio; 2º) a multiplicidade de meios; 3º) a natureza inter-media de muitas das suas obras; 4º) a utilização de meios digitais.

Transcrevo uma nota que escrevi em 93 sobre o autor:

E. M. DE MELO E CASTRO [Portugal] (1932-) foi um dos iniciadores do movimento de poesia concreta em Portugal, com o livro Ideogramas (1962). Não apenas com a sua prática poética, mas também com a sua teorização, ambas preocupadas em seguir as múltiplas vias da experimentação sistemática com a linguagem, tornou o experimentalismo uma das manifestações mais importantes da poesia portuguesa das últimas três décadas. Entre as suas obras de poesia contam-se: Queda Livre (1961), Mudo Mudando (1962), Objecto Poemático de Efeito Progressivo (1962), Poligonia do Soneto (1963), Versus-in-Versus (1965), Álea e Vazio (1971), Visão/Vision (1972), Concepto Incerto (1975), Resistência das Palavras (1975), Cara lh amas (1975), As Palavras Só-Lidas (1979), Re-Camões (1980) e Corpos Radiantes (1982). Aquelas obras estão parcialmente incluídas nas antologias Ciclo Queda Livre (1973), Círculos Afins (1977) e Autologia (Poemas Escolhidos 1951-1982) (1983). Algumas das suas obras de ensaio são: A Proposiçaõ 2.01 (1965), O Próprio Poético (1973), Dialéctica das Vanguardas (1976), Po.Ex — Textos Teóricos e Documentos da Poesia Experimental Portuguesa (com Ana Hatherly; 1981), Literatura Portuguesa de Invenção (1984), Projecto: Poesia (1984) e Poética dos Meios (1986). É também autor de várias antologias, entre as quais: Antologia da Poesia Concreta em Portugal (com José Alberto Marques; 1973), Contemporary Portuguese Poetry (com Helder Macedo; 1978) e Antologia da Poesia Portuguesa 1940-1977 (com Maria Alberta Menéres; 1979). Diversas exposições individuais, entre as quais: "Poemas Cinéticos" (Lisboa, 1965), "Concepto Incerto" (Lisboa, 1974) e "Delfos 2020" (Coimbra, 1980). Participação em diversas exposições colectivas: "Visopoemas" (Lisboa, 1965), "Poesia Visiva" (Roma, 1974), "Po.Ex 80" (Lisboa, 1980), "Poemografias" (Lisboa, 1985), "1º Festival Internacional de Poesia Viva" (Figueira da Foz, 1987), etc.

Nos últimos anos realizou várias obras no campo da videopoesia, encontrando na animação de imagem por computador um novo campo de experimentação poética. As suas animações transformam em movimento aquilo que em poemas visuais sobre papel é apenas sugestão estática de movimento, tirando partido não só do movimento das letras e das palavras, mas também da semântica das formas, das cores e da música. Os seus videopoemas constituem, no tema e na forma, uma síntese da consciência auto-reflexiva da ciência e da arte contemporâneas — uma síntese que é central em toda a sua obra. Videografia: Roda Lume (1969, 2 min. 43 s., reconstituido em 1986), Signagens (1985-89, 1h 30 min., inclui os seguintes videopoemas: "As Fontes do Texto", "Sete Setas", "Sede Fuga", "Rede Teia Labirinto", "Vibrações", "Um Furo no Universo"; "Come Fome"; "Hipnotismo"; "Ponto Sinal, Polígono Pessoal"; "O Soneto, Oh Poética dos Meios"; "Concretas Abstracções"; "Objectotem"; "Escrita da Memória"; "Infografitos"; "Ideovídeo"; "Diazulando"; "Metade de Nada" e "Vibrações Digitais de um Protocubo, Do Outro Lado"), Vogais as Cores Radiantes (1986, 3 min. 10 s.) e Sonhos de Geometria (1993, 30 min., música original de TELECTU), que será apresentado em ante-estreia no decurso da exposição "Wor(l)d Poem/ Poema Mu(n)do".

«Sonhos de Geometria (realizado expressamente para a revista Menu, de Cuenca) é uma meditação visual sobre a transformação do espaço e das formas desenvolvida em cinco andamentos. No primeiro faz-se uma evocação de figuras rupestres enigmáticas com referência à importância dos contrastes entre a escuridão e a luz na produção dessas mesmas figuras. No segundo — "O Sonho de Pitágoras" — assistimos ao nascimento da série numérica e da TETRAKTIS como forma simbólica de todas as relações numéricas. Daí chegar-se-á à descoberta do famoso Teorema. No "Sonho de Euclides" a geometria plana aspira às três dimensões com o ritmo alternante das figuras e com o traçado rigoroso de projecções e de curvas. No quarto sonho, o de Mandelbrot, detectam-se as origens naturais da invenção da geometria fractal a partir de nuvens e árvores em iterações sucessivas e em alternância com a forma do atractor que é o resultado desta investigação. Finalmente o meu próprio sonho é o da leitura e o da releitura. As imagens são citações da minha própria poesia concreta dos anos 60 e do meu primeiro videopoema, Roda Lume de 1969. Mas todo o conjunto é um exercício de releitura através dos meios específicos de produção e organização de imagem que são o computador e o vídeo.» E. M. de Melo e Castro, 1993.

in Manuel Portela, org., Wor(l)d Poem/ Poema Mu(n)do, Figueira da Foz: Museu Dr Santos Rocha, 1993, pp. 76-78.

sexta-feira, abril 14, 2006

Conseguimos imaginar máquinas que escrevam? (2)



Italo Calvino, no texto "Cibernética e fantasmas" (1967), responde, de certo modo, afirmativamente. Depois de passar em revista a literatura que recorria a processos combinatórios explícitos, Calvino refere que o interesse não estava tanto na construção de um computador capaz da criação literária, mas antes nas conjecturas que daí advinham. A resposta de Calvino inverte o problema, deslocando a atenção para a natureza do processo literário: o/a escritor/a já seria um autómato literário. Mesmos os alegados atributos psicológicos do eu poderiam ser formalizados como decorrendo das regras da escrita. O jogo entre os elementos combinatórios da escrita e o inconsciente, daí resultante, daria origem ao dispositivo labiríntico que o/a leitor/a interpreta como literatura. Trata-se portanto de reconhecer o/a autor/a como produto algorítmico das combinações da escrita e não como sujeito empírico que se transpõe para o papel. Calvino escreve, por exemplo, isto:

«O eu do autor ao escrever dissolve-se: a chamada "personalidade" do escritor é interna ao acto de escrever, é um produto e um modo de escrita. Também uma máquina escrevente, em que tenha sido inserida uma instrução a condizer, poderá elaborar na página uma "personalidade" de escritor destacada e inconfundível, ou então poderá ser regulada de modo a evoluir ou a transformar "personalidades" por cada obra que compõe. O escritor, tal como tem sido até agora, já é máquina escrevente, ou seja, é-o quando funciona bem [...]»

Se o/a escritor/a é uma máquina que escreve, o que acontece quando se escreve com máquinas que escrevem? Os vários exemplos referidos por Jorge Luiz Antonio na sexta-feira passada dão uma resposta histórica a esta questão, mostrando diversos géneros de poesia electrónica e digital. Vejam-se exemplos na exposição de poesia visual e electrónica International Exhibition of Visual and Electronic Poetry (Novembro de 2005, organizada por Jorge Luiz Antonio, Hugo Pontes e Roberto Keppler, em Itu, Estado de São Paulo, Brasil).

escritas sobrepostas

Os acrílicos de Bartolomé Ferrando são compostos por palavras sobrepostas, formando diferentes padrões sobre um fundo de cor. Aos leitores é-lhes pedido que destrincem as letras e as palavras, isto é, que des-sobreponham as escritas. Com este exercício, as "escrituras superpuestas" dirigem imediatamente a atenção para o acto de ler nas suas múltiplas ressonâncias: ler como decifração de traços, ler como reconhecimento de signos, ler como vocalização de uma notação gráfica (interpretação vocal), ler como interpretação (interpretação semântica). A extraordinária complexidade da escrita torna-se assim o tema desta série de obras. O que tem a escrita de particular? É apenas um código de segunda ordem, isto é, que representa o código linguístico (neste caso, de um modo alfabético)? Que outras possibilidades de sentido contém a escrita? Sendo também uma forma de notação fonética (que nos diz como criar pausas e associações entre os signos, como criar ênfases, como tornar o ritmo mais lento ou mais rápido), que papel cabe ao intérprete? Como é que este encontra o seu lugar na notação que a escrita constitui?

Vejamos os dois pequenos palimpsestos escolhidos: "o som incrustado em si mesmo alberga absorto o seu próprio nascimento" e "escreve e caminha sobre a sua própria página oca escrita voz". Como todas as figuras da série, também estas são auto-referenciais, isto é, contêm antes de mais uma descrição de si mesmas. O "incrustado em si mesmo" e a "sua própria página" remetem para a sua própria disposição na página. Num caso, o texto visual parece dizer alguma coisa sobre a escrita como notação para o som. Noutro caso, o texto visual parece sugerir a escrita como qualquer coisa que excede a voz ou que é voz por si mesma. Esta tensão entre representar outra coisa (o som) e ser (o traço da escrita) parece constituir o cerne deste conjunto de obras. Por outro lado, podemos ver aqui um exemplo consumado de arte inter-media, isto é, de uma prática artística em que a dimensão literária e a dimensão pictórica não são separáveis.

quinta-feira, abril 13, 2006

Conferência sobre Poesia Electrónica no Brasil

Digna de nota - parece-me - a conferência sobre Poesia Electrónica no Brasil que decorreu no passado dia 7 na Faculdade de Letras.
Jorge Luiz António apresentou-nos a sua tese sobre o assunto, acrescentando inúmeros autores e formas de digitalizar a poesia às que já vinhamos conhecendo. Uma breve história do desenvolvimento da Poesia Digital no Brasil.
Organizando cronologicamente os acontecimentos, percorreu nomes como Albertus Marques, Alckmar Luiz dos Santos, Gilberto Prado, Elson Fróes, Augusto de Campos, André Vallias, Philadelpho Menezes, Avelino de Araújo, Wilton Azevedo e Álvaro Andrade Garcia; conceitos como poesia algorítmica, soneto ecológico, interpoesia e novas formas de poesia electrónica tais como o formato .gif, o CD-Rom, a imagem flash ou o Microsoft PowerPoint.
Destaco, ainda, o website www.ciberpoesia.com.br que nos foi dado a conhecer, por conter poemas especialmente dedicados às crianças. É uma forma de estimular as gerações futuras a conhecer e explorar as potencialidades do que já é o futuro da poesia.

quarta-feira, abril 12, 2006

Conseguimos imaginar máquinas que escrevam? (1)



A máquina de escrever, inventada na segunda metade do século XIX, é a primeira tentativa bem sucedida de colocar a letra de imprensa nas mãos do/a escritor/a. A dactilografia é, de certo modo, uma precursora do processador de texto. O dedo e a letra de imprensa passam a estar directamente ligados através do interface do teclado. Esta mediação susbtitui progressivamente a relação caligráfica com a escrita. A máquina de escrever introduz portanto mais um nível de mediação entre o/a escritor/a e o papel. Os efeitos desta tecnologia sobre a criação literária são visíveis na poesia e na ficção modernistas, já que a utilização do espaço da página adopta certas propriedades dactiloscritas. A máquina de escrever ainda não escreve sozinha, mas escreve-se com ela. Ou seja, uma vez adoptada como instrumento de composição, este dispositivo mecânico gera um conjunto de novas propriedades da escrita. Os programas de processamento de texto e os motores textuais actuais redefinem o espaço de escrita e alargam o campo semântico da expressão "máquina de escrever", introduzindo novas propriedades nesse espaço.