Raymond Queneau, "Exercices de style"
Em "Exercices de style" Raymond Queneau descreve-nos um acontecimento absolutamente banal de 99 maneiras diferentes.
À primeira vista o que poderia parecer uma tarefa absolutamente impossível (como seria possível haver tantas maneiras de contar uma cena tão quotidiana?) é de facto um verdadeiro exercício da mente, da escrita e da imaginação.
Levando a escrita e as suas convenções a um nível ainda mais alargado, Queneau presenteia-nos com versões deliciosas do encontro entre dois estranhos num autocarro.
Se “quem conta um conto acrescenta-lhe um ponto” também é verdade que quem lhe retira um ponto pode por vezes acrescentar pormenores que de outra forma não teríamos prestado atenção. Cada versão acrescenta dados novos à descrição do acontecimento e embora algumas versões sejam mais minimalistas a ideia de potencialidade está sempre presente. Basta a leitura de algumas das 99 versões para nos apercebermos que a maneira como normalmente descrevemos as coisas é apenas uma das inúmeras possibilidades. Explorando as convenções da escrita, que já é em si uma convenção, podemos mostrar vários mundos dentro do mesmo mundo, 99 encontros dentro do mesmo encontro.
A fuga às regras da escrita, que à partida espartilham o que contamos, será então a mais criativa de todas as regras.