quarta-feira, novembro 12, 2008

"O jardim dos caminhos que se bifurcam"

“Deixo aos meus porvires (não a todos) o meu jardim dos caminhos que se bifurcam.”
O labirinto de Ts’ui Pen surge nesta trama de espiões como alegoria à divisão do espaço e do tempo em múltiplas realidades. O que é possível numa realidade não o será noutra, porque as circunstâncias dos acontecimentos variam de universo para universo. O próprio Stephen Albert, personagem que descobriu o segredo da obra de Ts’ui Pen, refere-se a diferentes possibilidades de desenlace do mesmo evento em tempos paralelos: “Neste [tempo], que um favorável acaso me proporciona, você chegou a minha casa; noutro, você, ao atravessar o jardim, deu comigo morto; e noutro, eu digo estas mesmas palavras, mas sou um erro, um fantasma.” (…) “Num deles sou seu inimigo.”
Tal como Ts’ui Pen, ao referir que não deixa (ou não pode deixar) o seu legado a todos os futuros, Stephen Albert afirma que um indivíduo pode não existir em todas as realidades. O tempo bifurca-se a partir das escolhas de cada indivíduo, dando origem exponencial a outros tempos, num continuum infinito.
Mesmo antes de ser confrontado com a obra do seu antepassado, Yu Tsun, personagem principal, caminha pelo seu próprio labirinto espaço – temporal. Ao dirigir-se para a casa de Stephen Albert, o espião depara-se com as sucessivas bifurcações ao longo do percurso. Poderia escolher qualquer outro curso para a sua história, mas opta por completar a sua missão final para os alemães, no ano de 1916.
O conto de Jorge Luís Borges permite-nos, portanto, reflectir acerca da importância da escolha no desenho da vida e do labirinto invisível que se tece a cada passo que se dá. A obra acaba por ser uma metáfora para ela própria, ao suscitar no leitor a reflexão sobre os vários tempos possíveis e é também um óculo que nos permite contemplar um labirinto dentro de outro labirinto.