terça-feira, março 20, 2007

Evolução

Do pergaminho ao livro manuscrito, do códice impresso ao hipertexto, são quatro as etapas base de evolução do livro. Em todas identificamos um mesmo objectivo, de perservar e partilhar informação, derivando desta, outras preocupações, consoante os momentos históricos. Actualmente, na era digital e com o hipertexto, a conservação de conteúdos parece ter-se tornado na menor delas, sobrevalorizando-se quantidade em detrimento da qualidade. Se temos acesso quase imediato a um volume de informação há meia dúzia de décadas atrás inimaginável, não há nada que nos garanta a credibilidade da mesma, pelo que esta brutal liberdade de publicação não nos é obrigatoriamente uma mais-valia, podendo mesmo constituir um problema, e levar-nos a afirmar barbaridades que tomámos como verdadeiras. Não que seja fã de censuras prévias ou póstumas, e é fantástico podermo-nos expressar ao planeta inteiro sem sairmos do nosso quarto. No campo das opiniões é muito bom, no dos factos um pouco menos, se bem que também nunca teremos certezas absolutas acerca de ditos factos enciclopédicos ocorridos nos anos 1000 (pois efectivamente, nenhum de nós, por enquanto, os pode ir lá confirmar). Pondo as coisas nestes termos, o que a hipermedia nos dá, que, comparativamente, a literatura nos tira, é tempo. O que é óptimo, pois em vez de semanas a fio de procura de obras e autores relaccionados para explorar um determinado tema, podemos sentar-nos calmamente em frente do nosso computador, escolher mesmo um de muitissimos motores de pesquisa, teclar "teorias sociológicas neo-evolucionistas de white", "política socio-económica do Qatar", "desporto no Antigo Egipto", "rituais de wicca" ou outra coisa qualquer, ao jeito de anúncio publicitário, sem perguntas e deixando mais tempo para o que é importante. A partir daí, os links fazem o resto. Descobrimos não só o que queríamos, como o que não queríamos, e ainda o que não sabíamos que queríamos e que também muito pouco tem a ver, mas que podemos investigar numa nova janela, ou na noite seguinte.
No que toca à literatura digital, um tapete vermelho de oportunidades desenrola-se aos nossos olhos, em que podemos sempre ser a estrela. Qualquer pessoa pode ser autor, comunicar, criticar, apresentar-se ao mundo, sem que nada nem nenhum velho do restelo conservador e capitalista a impeça. Para além das possibilidades técnicas e gráficas que o digital permite, de forma a organizar, complementar, acrescentar e dinamizar as obras, com uma enorme liberdade de expressão. Com som, movimento, cor e imagem, se as perspectivas interpretativas são muito maiores, compreendemos também melhor a do autor.
Parte agora de cada um de nós pensar bem no que escreve pois vai ser visto por um planeta inteiro. Se bem que se pode sempre lá ir corrigir...